Sobrados e mucambos

alguma mal parada, furtava os autos custasse o que custasse". Por tais meios é que grandes sítios, verdadeiras fazendas de padres e de particulares se derramaram pelas sesmarias das cidades, encarecendo o terreno, obrigando as casas menores a se ensardinharem ao pé dos morros e até nos mangues (depois por cima dos morros) e concorrendo para o agarrado anti-higiênico das habitações pobres e mesmo dos sobrados mais modestos. Os moradores das casas de sítio dos padres eram no Rio de Janeiro simples caseiros; o trabalho desses caseiros beneficiava o solo e valorizava as terras, também valorizadas - informa João da Costa Ferreira em pesquisa recentemente publicada sobre o termo da cidade - pela "proximidade em que se achavam do centro urbano que prosperava incessantemente, pelo crescimento de sua população, pelo desenvolvimento do seu comércio". Mas essa valorização, com sacrifício da parte mais pobre da população e do patrimônio da cidade. Com sacrifício das ruas que deviam existir e não existiam, seu lugar tomado e suas funções pervertidas pelos simples caminhos dos sítios dos padres e dos particulares, pelos becos, pelas vielas sempre fedendo a mijo.

Por muito tempo, as Câmaras, os juízes, as Ordens Reais, quase nada puderam contra particulares tão poderosos. A sombra do feudalismo da casa-grande caía em cheio sobre as cidades. As ruas eram simples caminhos a serviço das casas poderosas.

A partir dos princípios do século XIX é que foi se proibindo aos proprietários de casas dentro das cidades uns tantos abusos: as biqueiras que desaguavam tão arrogantemente sobre a rua; as janelas e as portas que se escancaravam tão insolentemente sobre a rua; o abuso de certos moradores de criar porco no meio da rua. Só o porco "com canga triangular e argola no beiço", determinava em 1834 a Câmara de Olinda que se deixasse

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