pacientes, o sedentarismo, dos que amam as cousas do espírito, a aversão aos modos vivazes dos parentes paternos, a cordura natural, um orgulho macio e indomável, o culto da magnanimidade, o senso da justiça, o forte personalismo... Seria a antítese de D. Pedro I, o amoroso caçador de aventuras, o guerreiro e o impulsivo, que ardeu na própria paixão, queimando-se e iluminando o século; tímido, contemplativo, pacífico, inclinado à misantropia e amigo do silêncio, levava no semblante e na alma a tristeza da imperatriz ao tempo em que o gerara. Não havia quem a não recordasse - a inadaptada - vendo-lhe o filho calado, de queixo saliente e fronte abaulada, sempre agarrado à saia da ama, com um pavor vago e inaudito a encher de fantasmas as suas longas noites...
As noites, principalmente, na Quinta da Boa Vista, deixaram-lhe na imaginação um sulco indelével.
A floresta virgem roçava os ângulos do palácio. Uivava o vento no arvoredo e as águas próximas churriavam em cascatas, casando o seu ruído monótono com o coaxar das rãs, todos os confusos rumores da selva aguçados pela esplêndida limpidez das noites secas, de céu estrelado e claro. Pouca gente frequentava o Paço. Que iriam ver ali? Os salões desertos cheiravam a mofo. O desarranjo das casas desabitadas repetia-se por todos os aposentos que outrora os candelabros imensos alumiaram, destacando as portas de almofadas esculpidas, com capacetes da Guarda e águias imperiais, e os embravecidos retratos de família: D. Maria I, branca como um espectro, D. João VI com a sua flácida e pasmada gordura, o beiço belfo levemente irônico, de rei velhaco, os Austrias de uniformes reluzentes, um Jorge IV da Inglaterra de ar brejeiro, um Metternich com o seu olho vulpino, e D. Pedro I, doirado como um