por um lado assemelhada à Inquisição, cujos processos aperfeiçoara, por outro ligada à organização apostólica e internacional contra a Ideia Francesa. Um homem pôde simbolizá-la: o intendente Pina Manique. Tinha as qualidades do rafeiro em trilho de caça, as sutilezas do instinto, as energias da sociedade alarmada, infalível e inexorável. D. João respeitava-o como a uma forma, inevitável, da ordem: demais disso, ele era curioso, crédulo e fácil de convencer. Esse homem de poucas indagações foi ele toda a vida, e por isso cada ministro que lhe penetrara a intimidade, timorata e pacífica, o tutelou a seu modo.
Nasceu em Queluz D. Pedro, em 12 de outubro de 1798. Nele, os defeitos e as virtudes dos pais se combinaram de estranha maneira. O gênio, arrebatado e alegre, lho herdou a mãe: o pai transmitiu-lhe a clara ponderação dos momentos, mais raros de começo, de uma meditação séria. Cresceu com a dupla solicitação, do temperamento estourado de Carlota Joaquina e do senso burguês do príncipe regente, péssimo educador dos filhos, um dos quais lhe mutilou a monarquia, o outro quase lhe usurpou o trono. Diante dos seus olhos o equilíbrio, a ordem, a beleza eram impressões efêmeras: nos múltiplos círculos concêntricos da família, da corte, da capital, do Estado, a desordem imperava. A briga, surda e rancorosa, que separava o mais nobre casal português, estendia a todo o reino a sua sombra: os ministros desentendiam-se, as finanças arruinadas ameaçavam a independência nacional, o exército envelhecia,