Vida de D.Pedro I, o rei cavaleiro

rainha atirou ao pescoço de D. Pedro o colar da bravura e da fidelidade. Uma grossa lágrima deslizou pela face branca do imperador e um sorriso triste arrepiou-lhe os lábios. Talvez pensasse na frase de Byron, morrendo: "Oh! questa è una bella scena.." Estreitou nos braços a filha rainha, e quando ela se afastou, para chorar a um canto, abraçou-se ao crucifixo, que teve sobre o peito até expirar. Ajoelhado ao pé do leito, o arcebispo de Lacedomonia rezava.

A 23 murmurou: "Morro contente, porque a ninguém fiz mal."

Não o assaltou aí a exasperação do homem a quem o destino atraiçoa em plena glória. "Jamais houve uma morte tão tranquila", diria a imperatriz. Sobre o seu rosto desfeito descera a paz dos resignados e os seus olhos luzentes brilhavam da inteligência dos visionários. Afinal, a morte lhe chegara como uma ordenança que o clarim chamou: com pontualidade militar. Ainda no leito da agonia, em Queluz, D. Pedro já era demais em Portugal. Realizara a sua missão na terra e vivera totalmente o seu sonho político. Para o futuro, deslocado no seu país, talvez também no seu tempo, seria a vaga existência dos inadaptados que o esperava. Teria de emigrar, para D. Maria II poder reinar. Arrastaria pela Europa, como um cometa, a pesada cauda da lenda. O velho mundo que ele demolira levantar-se-ia dos próprios destroços para acusá-lo, e no exílio a sua nostalgia de rei sem trono o aproximaria instintivamente de outra sombra, errante e altiva - D. Miguel...

Vida de D.Pedro I, o rei cavaleiro - Página 309 - Thumb Visualização
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