sabia disso. Além da Correspondência, inúmeras cartas copiei de Capistrano, que vinham da família Prado, do Castelo das Pedras Altas (RS) de Assis Brasil, entre muitas outras.
Quando chegara do Ceará, Capistrano vinha com grandes planos. Escrevia nos jornais e em poucos dias preparou a tese de concurso para a cadeira de História do Brasil do Colégio Pedro II, com o título "O descobrimento do Brasil". A família aumentava. A vida parecia ir bem. Mas, de repente, tudo mudou e desgraças sobre desgraças começaram a chover sobre o cearense de Mecejana. A cadeira de História do Brasil pouco depois foi eliminada e Capistrano passou do rol de professor em efetivo exercício ao de professor aposentado. Pobre destino: aposentado. Em seguida, morre-lhe a mulher. A filha Honorina entra para um convento e ele, agnóstico, jamais se conformou em ser "sogro de Jesus". Morre depois o seu filho mais querido, que apelidara de Abril porque, dizia, tudo que lhe acontecera de bom ocorrera nesse mês. Suas cartas refletem sua dor desesperada.
Nos últimos anos, vestindo um terno preto, o único que lhe restara, deixou-se dominar pelo pessimismo e passou a assinar-se João Ninguém e Zero. Sofria, inesperadamente, as piores humilhações: chegando a São Paulo pelo noturno, dirigiu-se para a casa de Paulo Prado, que a esta hora estava dormindo. O mordomo recusou-se a deixá-lo entrar e ele ali, do lado de fora, ficou exposto ao frio e à garoa até que Paulo acordasse. Ao saber pelo mordomo que aquele velho o esperava lá fora, Paulo pulou imediatamente da cama, pediu desculpas ao amigo, que logo lhe solicitou um banho quente, e despediu o mordomo. Quando podia, passava temporadas em Pedras Altas e correspondia-se com a Sra. Assis Brasil.
Nos bons tempos, ia às vezes às estações de águas, pagando cinco mil-réis de diária, com todas as refeições.
Como estranhar que a sua letra se transformasse de tal modo que no final fosse quase ilegível?
José Honório chegou à conclusão de que era necessário mudar os planos. Parou a Correspondência e pôs todos os funcionários da Divisão trabalhando exclusivamente na Exposição Comemorativa do Centenário de Capistrano de Abreu. Era preciso ver o entusiasmo com que cada um se empenhava em dar o melhor de si mesmo para o sucesso dessa comemoração. Achavam-se todos imbuídos de que estavam colaborando numa obra da maior relevância, dedicada a quem ocupara um lugar importantíssimo na historiografia brasileira. J. H. R. dava a orientação geral, era a abelha-mestra, e todos agiam em redor dele em perfeita sincronia. Isso não o impedia de rever a perfeição dos detalhes e dar o toque final.
Afinal chegou o grande dia. Procurando, como sempre, auxiliar J. H. R., muito ocupado com os últimos pormenores, eu me pusera ao telefone e convocara cada um dos nossos amigos intelectuais, escritores, historiadores,