Em 1968, depois de participar de um Congresso de Arquivistas em Ottawa, no Canadá, José Honório foi convidado a voltar à Inglaterra durante 15 dias pelo Conselho Britânico. Eu estava com ele e ao chegarmos a Londres fomos logo procurar Humphreys. Ele era, no momento, Presidente da Royal Historical Society, da qual José Honório era o único membro brasileiro. Por esses dias seria comemorado o centenário daquela sociedade e Robin convidou-nos para comparecer ao grande banquete comemorativo, que exigia smocking.
Foi uma noite inesquecível. O Conselho Britânico mandou-nos buscar num automóvel Princess enorme, com um chofer uniformizado e enluvado. Ao chegarmos, abriu-nos a porta e indicou-nos o caminho a seguir. À entrada, Robin e Elizabeth, sua mulher - que trabalhara com Arnold Toynbee e nos levara para conhecê-lo na Chatham House em 1950, filha de um grande historiador, formada em História -, recebiam os historiadores que iam chegando de várias partes do país e do Brasil.
À sobremesa começaram os discursos. O primeiro a falar foi o Ministro da Justiça. Referiu-se a um escândalo recente de seu antecessor com uma call-girl, amplamente explorado pela imprensa. "Imaginem se fosse eu que estivesse no lugar dele e fosse fotografado pelo Daily Mirror!..." Houve uma gargalhada geral. Eu e José Honório nos entreolhamos atônitos. Perguntei ao senhor ao meu lado: "Este é o estilo dos discursos em ocasiões como esta?" Indagou-me a minha nacionalidade e respondeu: "Claro. Se o orador não conseguir fazer o auditório rir às bandeiras despregadas, o discurso é considerado horrível".
Ao chegar a vez de Humphreys falar - ele que é o retrato da sisudez e do feitio fechado inglês, com poucas exceções - conseguiu incluir na sua oração duas piadas, de maneira meio desajeitada. E seus colegas riram. Estava salva a Pátria.
Se Rui Barbosa tivesse assistido a uma comemoração igual a essa, certamente a incluiria nas suas Cartas da Inglaterra, pois é o contrário de tudo o que se pratica em Portugal e no Brasil em matéria de discurso solene!
Charles R. Boxer, ex-Professor da Universidade de Londres, onde sucedeu Edgar Prestage na cadeira "Camoens" do King's College: "A morte de José Honório é uma perda para a cultura brasileira em geral e para todos os historiadores interessados na História do Brasil de 1500 a 1987. Sempre guardarei na memória a minha amizade com vocês dois, desde o nosso primeiro encontro há mais de 40 anos até agora. Aprendi muito com José Honório e sempre o considerei o meu Mestre Exímio na História do Brasil. Serve um pouco de consolo saber que os seus livros viverão muito depois de sua partida, e eu, particularmente, tenho em alta estima o exemplar da sua Historiografia e bibliografia do domínio holandês no Brasil, que ele me deu em janeiro de 1950, e seu Vida e História, que me ofereceu na minha última visita" (Carta em inglês de 7-5-1987).