a quem deve sua carreira, mas seu livro é sobre a história colonial, não lhe dando oportunidade de revelar seu monarquismo e bragantismo.
Queira ou não Varnhagen, o sentido da história do Brasil que transparece em sua obra se revela na luta até o extermínio dos índios, na submissão dos escravos negros, nas rebeliões e insurreições de uns e outros, no terror oficial da política portuguesa, na insegurança de todos, principalmente da maioria na força dos potentados, nas grandes fomes e grandes epidemias, nas fraquezas e demora da Justiça, enfim, no solo encharcado do sangue dos mais humildes e modestos.
Quem ler a História geral do Brasil verá que, neste país, durante a Colônia, o grande problema foi sempre o de garantir e assegurar os direitos da maioria contra os abusos da minoria possuidora do poder e da riqueza. Perseguições políticas e religiosas, discriminações raciais, censura, absolutismo, falta de ensino, de imprensa, somam-se aos excessos dos castigos exemplares dados às maiorias conservadas sempre em estado de minoridade política e civil. Abusos de autoridades, lutas entre governadores e magistrados, corrupção e relação das minorias dirigentes com o povo, a sociedade - governos longos, de 30, 25, 15 anos não são exceção - dão à História geral do Brasil um sentido revelador: o historiador conservador não consegue ocultar as mazelas do colonianismo português.
O longo e sinuoso caminho colonial da história do Brasil não foi escondido por Varnhagen. Não é surpresa que um homem tão solidamente fortificado na sua ideologia conservadora e na sua política pragmática, que jamais colocou o debate no terreno abstrato e absoluto da Justiça, mas no da convivência e da utilidade, como observou Capistrano de Abreu, deixasse ocultas as fraquezas essenciais do colonialismo. E não é surpresa não só porque é forte a sua convicção de que serve à verdade, como toda a crítica moderada ao colonialismo não aparece em conjunto, mas parceladamente. As mazelas vão aparecendo aos poucos e, muitas vezes, não são consideradas como tais, pois em matéria de índios e negros, por exemplo, Varnhagen aceita como lícita a escravatura: desde 1849, no Memorial orgânico(23) Nota do Autor, acha que "não temos outro recurso para não estarmos à espera que eles [os índios] queiram civilizar-se do que o de declarar a guerra aos que não resolvam a submeter-se e ocupar pela força [grifo do Autor] essas terras pingues que estão roubando à civilização".
Os avanços e recuos da política indígena portuguesa, as sublevações indígenas, as insurreições negras que marcam nossa história mereceram sempre sua total reprovação.
A opinião de Varnhagen não era isolada, mas representativa da política colonial portuguesa dominante na época. O Tenente norte-americano Herndon contou a Handelmann que um português do Pará lhe dissera, em 1852, que, em matéria de reforma dos índios, o melhor seria enforcá-los a todos.