Do Brasil filipino ao Brasil de 1640

5°) Resta analisar o testemunho seiscentista de Torsay, que deu origem à suposição dos historiadores citados. Do autor, quase tudo se ignora, sabendo-se que o seu nome era Herman Taffin e que possuía o título de Senhor de Torsay. Em 1570 fora agente de Catarina de Médicis nos Países Baixos (34) Nota do Autor.

Cimber e Danjou apresentam-no como governador de Filipe Strozzi; mas a verdade é que o seu nome somente uma vez aparece citado na correspondência do general: em 15 de julho de 1582, quando Strozzi o enviou, com uma carta, ao cavaleiro de Elbenne, para tratar de um assunto privado. Isto é, aceita-se que desempenhou funções de agente junto do Almirante, mas nunca de governador ou secretário, pois este cargo pertencia a Fournicon ou Forniconi, como comprovam textos coevos e o próprio La Roncière (35) Nota do Autor.

Sobre Torsay acrescente-se ainda que não tomou parte na expedição dos Açores, pois nas vésperas da partida da esquadra foi enviado a Paris, com a já referida missão junto de Elbenne, pelo que seu relato da batalha se trata de uma descrição de outiva. Não sendo, pois, uma personagem da intimidade do Almirante da frota, como dar crédito a um informe que nenhuma outra fonte coeva refere e que o próprio Torsay poderia ter escutado anos decorridos sobre o acontecimento? Não se olvide que a obra apenas foi publicada um quarto de século depois da batalha naval, pelo que se pode definir de livro encomiástico, cheio de pormenores laudativos e destinado a tirar do esquecimento uma figura de triste celebridade no tempo, pelas condições dramáticas da sua morte. Mas perante fontes coevas como o epistolário dos reis de França e de Strozzi — que guardam silêncio sobre a renúncia de direitos, o texto de Torsay perde todo o valor documental que pudesse conter.

O problema pode, no entanto, apresentar um novo aspecto e vale a pena considerá-lo. Dada a situação material em que se achava para com a Corte francesa, o Prior do Crato foi obrigado a autorizar que os navios de França aportassem à costa do Brasil e que ali tentassem estabelecer comércio ou impor à colônia a causa do pretendente. Esta concessão, a ter sido feita — e temos provas seguras de que o foi — não implicava o abandono de uma soberania, embora fictícia, que poderia vir a realizar-se.

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