Deodoro: a espada contra o Império Tomo 1 – O aprendiz de feiticeiro (da Revolta Praieira ao Gabinete Ouro Preto)

filho da sua única vontade, não lhe podendo servir de atenuante o parecer do procurador fiscal, já habituado a aconselhar, em documentos oficiais, a violação das leis, e porque tal parecer, se é exato o que afirma o denunciado em seu despacho quando diz que de acordo com ele mandou fazer o pagamento, é contrário ao espírito e letra da lei, não tem além disso fôrça deliberativa, não sendo o presidente obrigado a segui-lo, e seu efeito desaparece diante do ato do presidente, que é o responsável.

Do exposto é concludente que o denunciado praticou o crime previsto no art. 129, § § 1.° e 2.° do Cód. Crim., procedendo contra a literal disposição das leis e infringindo-as. E nem se diga que o denunciado, procedendo contra a expressa disposição da lei, não fizesse por afeição ou contemplação, porque, quer na situação conservadora até 1878, quer na liberal decaída em 1885, quer na primeira administração efetiva do desembargador Henrique Pereira de Lucena, não conseguiu Luís Ferreira de Abreu o seu intento.

Ressalta a imoralidade do ato pela circunstância de ter o peticionário pertencido ao partido liberal até o tempo em que a decisão da assembléia provincial, em unanimidade representando esse partido, foi contrária à sua pretensão; desenganado o peticionário, alistou-se no partido conservador, esperando o resultado que agora alcançou!

Diante de tão flagrante delito duvidar da punição de prevaricador seria irrogar à justiça e retidão com que V. M. Imperial costuma sempre proceder a mais clamorosa injúria.

O denunciante tem fé, Senhor, que o Cód. Crim. não será letra morta, principalmente para a alta administração do país, e que um fato de tanta gravidade não ficará impune.

E quando mesmo não se considerasse provado o segundo elemento constitutivo do § 1.° do art. 129 do Cód. Crim., ainda assim o denunciado não pode escapar da sanção penal, porquanto aí está expressa disposição do art. 160 do citado Cód. Crim. impondo penas severas aos que julgam ou procedem contra lei expressa.

O denunciante, Senhor, sente a responsabilidade moral em que incorre com a posição que, pela gravidade do fato, é obrigado a assumir; não cedeu a nenhum sentimento de ordem pessoal, mas cumpre, inspirado pelo patriotismo, um rigoroso dever cívico.

Representante da província, em sua assembléia, quer sustentar suas prerrogativas, zelar e defender sua fazenda e seus direitos.

Nenhum sentimento hostil anima o denunciante contra o denunciado. Se, quando ministro de estado, o denunciante distinguiu o denunciado, pela nomeação que teve do governo para segundo cargo da alta administração da guerra, julgando-o com qualidades, que agora, na administração civil mostra não possuir; com igual isenção de espírito, em nome das leis violadas e dos dinheiros públicos da sua província, criminosamente desviados dos seus cofres em proveito particular, pede à justiça de V. M. Imperial a sua punição.

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