Jean-Baptiste Debret

O pior elemento da construção civil não era, no entanto, o primitivo obreiro africano, mas o mestre português, monopolizador das obras do Rio de Janeiro. Atrasado na técnica e mais conhecimentos, sem veleidades de melhorar velhos métodos e procurar novos recursos, constituía intransponível obstáculo para Grandjean de Montigny e demais missionários, inclusive artífices. Os mais aproveitáveis operários locais eram os carpinteiros pretos livres do arsenal de marinha, que nos lazeres se empregavam na construção civil. As deficiências técnicas resultantes suscitaram fundadas observações de Debret e companheiros, abismados acerca daquela maneira de trabalhar. Motejava a propósito Hipólito Taunay a ciência dos construtores cariocas: "Les architectes de Rio de Janeiro (...) sont brouillés avec l'angle droit positif. Tous les montants des portes et des fenêtres en forment un insensiblement obtus (...) Il n'y a pas d'appartement qui soit un carré exact; c'est un losange dont les angles ont la même valeur que celui de la coupe des pierres; il n'existe assurément pas deux villes au monde sur ce modele".

Excetuava-se a arte de cantaria, no reino continuamente praticada desde antes dos romanos, providencial elemento que vemos surgir nas melhores construções, apud o desenho de Ender relativo ao enorme casarão do ricaço Sequeira em Mata-Porcos, magnificamente enquadrado pelo granito cinza claro do Rio de Janeiro. A tradição, porém, dominante no reino e imperativa na colônia, impunha o emprego exclusivo do mármore lioz, por sinal belíssimo, extraído nas proximidades de Lisboa para ser empregado em palácios e igrejas. Chegavam as pedras prontas e numeradas como se fossem ter a Queluz ou ao centro comercial de Lisboa. Assim se elevaram os principais edifícios coloniais, os quais, na falta de elegância, pelo menos disporiam de indubitável solidez. Uma das causas do aspecto desgracioso das ruas cariocas decorria de toscos muros exageradamente espessos e pesados caixilhos de portas e janelas de casas geralmente estreitas com andares superiores de baixo pé direito.

O Rio de Janeiro contava com pouco mais de cento e trinta mil habitantes na aclamação de D. João VI. Crescia, porém, o número de dia para dia, dada a afluência de pessoas do exterior e das capitanias do Brasil, adensada na diminuta superfície descrita no mapa de Debret, apenso ao álbum Didot. A parte mais importante da cidade começava na igreja da Lapa, continuava pela rua dos Barbonos até a da Guarda Velha, passava diante do convento de Santo

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