Jean-Baptiste Debret

nos comerciantes da rua do Ouvidor como entre proprietários de restaurantes e hoteleiros próximos do porto, sem contar toda sorte de pássaros de arribação, tangidos pelos últimos acontecimentos. Formara-se em Paris, sobre os degraus do trono, o partido dos "ultras", ou seja, ultrarreacionários, legitimistas dispostos a reagir pela violência contra adversos ao regime, tido como legítimo, dos Bourbons eleitos pelo Senhor, para maior felicidade dos súditos. Se bem, no princípio, a volta dos antigos Príncipes, quase somente apoiados pela Grã-Bretanha, representasse alívio ao europeu em geral e francês em particular, dessangrados por guerras sucessivas, continuava o vírus remanescente da Grande Revolução a fermentar no seio das massas e espírito dos intelectuais. Os choques supervenientes produziram intenso movimento repressivo apelidado "Terreur Blanche", causador do êxodo de artistas e escritores.

O único dos antigos inquilinos do palácio de Versalhes, avesso às exacerbações, era o inteligente Luís XVIII, rodeado por ministério composto de homens capazes, porém sem forças para impedir excessos repressivos. A duquesa de Angoulême, filha de Luís XVI, abominava a todos que tinham servido o Império. Sequer excluía da aversão a artistas, inda não fossem regicidas como David, porém autores de trabalhos destinados à propaganda do corso, avantesma da sua família. O sogro, conde de Artois, herdeiro do trono, irmão do soberano, era espírito superficial sob influxo de lamentável entourage composto de ambiciosos e medíocres, infensos a estadistas experientes como Talleyrand, que chamavam "padre casado" a despeito da ajuda que lhes poderia prestar. Todos só tinham em vista destruir efeitos de acontecimentos e volver a tempos idos, intolerantes e infensos ao que lhes recordasse dias atrozes quando ruíra o trono e parentes e amigos tinham perdido a vida. Neste ambiente conturbado, procurava Luís XVIII reinar com ajuda de competente ministério, o melhor de que desde muito a França dispusera, infelizmente empecido por bonapartistas e legitimistas, liberais e contrarrevolucionários, sem contar os efeitos deprimentes dos desastrosos Cem Dias, causa de nova intervenção dos aliados. Dizia-se, nesta altura, que o primeiro-ministro do Rei de França depois de Waterloo, era o embaixador dos russos Pozzo di Borgo.

Assim sendo, torna-se mais explicável a presença no Rio de Janeiro do general de Napoleão, o holandês Hogendorp, antigo governador de Vilna. Este fanático do corso muito provavelmente

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