À sombra de Rui Barbosa

postos do governo. A presidência da Bahia coube a Homem de Melo, paulista, fiel partidário, erudito e que punha sua erudição a serviço da teoria de seu grupo político.

Mas uma questão logo empolgou os grandes líderes do momento. Era fora de dúvida que a missão, justificativa da ascensão do novo Partido, era a reforma da lei eleitoral e o estabelecimento do pleito direto. Mas a eleição em dois graus, ou indireta, era prescrita pelo texto da Constituição. Seria possível reformar o sistema sem tocar na Magna Carta?

O precedente trabalhoso da reforma votada em 1834, que se denominou Ato Adicional, obedecendo rigorosamente aos trâmites da própria Carta, não aconselharia uma outra maneira mais imediata de resolver o problema? Segundo a Carta, uma só legislatura não poderia jamais alterar o texto constitucional. Deveria limitar-se a indicar por lei os pontos reformáveis. Uma nova legislatura, e não uma nova sessão ânua, procederia então à reforma, mas dentro dos limites da lei anterior. Uma nova legislatura, quer dizer, uma assembleia escolhida por eleitores cientes dos pontos em debate; assembleia que se considerava munida de poderes específicos para aquelas reformas. Nenhuma das duas assembleias se poderia considerar soberana para a reforma. A primeira só poderia delimitar os pontos reformáveis e a segunda não poderia reformar senão os pontos previamente delimitados. Isto parecia a muitos teóricos da soberania popular uma limitação intolerável da soberania de uma assembleia. Este era o ponto de vista de Rui Barbosa, que não admitia uma "constituinte constituída". Uma vez confiados aos deputados os famosos "poderes especiais", eles passariam a encarnar a própria vontade nacional, e não poderiam ser contidos por limites marcados por uma assembleia ordinária. A ideia era muito mais revolucionária do que pode parecer à primeira vista. O Senado, por exemplo, que era vitalício, poderia ser transformado em temporário por uma deliberação da Câmara revestida daqueles poderes especiais constituintes? Se sim, teríamos uma transformação profunda na base de nosso sistema político, sem que os senadores, que representavam a elite da classe dos estadistas, pudessem atuar. No sistema da Carta, eles influiriam (e a experiência de 1834 fora extremamente eloquente) ao menos na lei preliminar, onde haviam salvo, entre outras pequenas medidas, a vitaliciedade do Senado.

Ora, Sinimbu, que era um político honrado e hábil, não era homem de larga visão, nem tinha ousadia para tão grave empreendimento. Sinceramente liberal, ele era agricultor, ainda que modesto; queria transformações, mas não pôr em risco a

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