Devoção e escravidão. A Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos no Distrito Diamantino no século XVIII

outras cidades mineiras antigas, essas igrejas estão situadas em pontos não centrais das vilas e arraiais, como Ouro Preto, no cimo de um morro íngreme, mas sobressaindo na paisagem. A de Mariana também se encontra afastada da antiga parte central da "mui nobre e leal cidade". Isso não constitui, entretanto, regra fixa; em S. João del Rei, por exemplo, a igreja do Rosário forma triângulo com a de Nossa Senhora do Carmo e a antiga matriz.

Esses casos não bastam para desmentir a regra: o Templo do Rosário não é dos mais bem localizados nas cidades mineiras do Setecentos, o que parece demonstrar que, quando os pretos tiveram possibilidades suficientes de abandonar seus antigos altares emprestados, não lhes foi possível ocupar os lugares de maior destaque. O terem sido construídos a partir dos últimos 30 ou 40 anos do século não seria explicação suficiente, pois são contemporâneos das igrejas do Carmo e de S. Francisco, que ocupam geralmente posições mais centrais e melhores. Cabe perguntar se a localização das igrejas dos pretos não se deve a ação de brancos aos quais não faltaram meios para impedir que o templo do homem de cor ocupasse um local de realce. Além da falta de recursos financeiros dos irmãos do Rosário, os oficiais da Câmara, sempre membros de confrarias de prestígio, utilizar-se-iam de outros recursos para conseguir seus fins. Um deles é a doação do terreno feita pela Câmara Municipal com pretexto de piedade.

Faltam-nos notícias seguras sobre a escolha do sítio da Igreja do Rosário no Tijuco. Sabemos, entretanto que foi construída onde havia uma ermida, numa baixada, próxima à antiga saída do arraial. Certamente o negro se viu impossibilitado de fazer exigências e foi empurrado para local desdenhado pelos senhores.

Mas, na construção em si, que dependia exclusivamente dos membros da irmandade, o homem de cor procurou conscientemente seguir o modelo das demais.

É evidente que a taipa e o pau-a-pique não permitem grandes voos arquitetônicos e a planta das igrejas vê-se condicionada pelo material pobre, impedindo uma originalidade estrutural. Nesse aspecto é natural, pois que o Rosário do Tijuco não se afaste dos modelos da região e da Capitania. Em Diamantina não se utilizou a pedra como em outras vilas e arraiais mineiros, mas também em outro ponto os templos são diferentes: têm proporções menores, são muito mais simples e lineares. Apesar da riqueza da região, tais igrejas não ostentam o luxo das de Mariana e Ouro Preto do período, talvez em razão do sistema de controle rígido a que ficava sujeito o Distrito e também do fato de se concentrar fortuna em pouquíssimas mãos. Isso não é obstáculo, entretanto, ao bom gosto, à elegância e à simplicidade que as distinguem por vezes.

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