Devoção e escravidão. A Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos no Distrito Diamantino no século XVIII

coisas, talvez à importância maior que tiveram nos Setecentos, quando mais acentuada é a autoridade régia. Seja como for, parece diferente o modo de agir das mesmas confrarias em Portugal e nas Minas Gerais. É de notar-se que, já no século XVI, houve na Irmandade do Rosário do Convento de S. Domingos de Lisboa um conflito entre brancos e pretos, que teve como resultado a intervenção direta de Roma.(31) Nota do Autor

Neste conflito, os brancos tentaram apoiar-se na hierarquia eclesiástica, enquanto os pretos, sem abandonar esta, parecem ter buscado apoio na pessoa do monarca. Enquanto os brancos obtêm a seu favor dois Breves do Superior dos dominicanos, além de uma exortação aos pretos para que obedeçam, acabando no final por recorrer a Roma, os negros parecem ter buscado o amparo do Rei. Só isso explica o fato de se ter conseguido manter separadamente uma Irmandade de brancos e outra de pretos, conforme o desejavam estes, ao passo que os primeiros as queriam unidas. É significativo que tendo os brancos recorrido ao Papa, Sua Santidade respondeu ao apelo.

As irmandades brasileiras não apelam para Roma, em contraste com o que fizeram os membros do Rosário de S. Domingos de Lisboa. A única menção que encontramos a um caso de confrarias mineiras que não se contentam com um recurso à Coroa vem na crítica feita por certos padres, que acusam as associações de haverem desobedecido às ordens reais. Desculpando-se, assim respondem as Ordens Terceiras:

"Alguns Parochos daquella Cappitania em nome de todos levarão juncto ao Real Throno húa delatação em q figurarão os Supp.es como Corporações sediciosas e authoras de Conventiculos perniciosos, e q athé tinhão recorrido aos seus Geraes em Roma e Castela (...)."(32) Nota do Autor

Essa defesa das Ordens Terceiras é muito esclarecedora. Nela vemos como até os padres consideravam o Rei autoridade suprema em assuntos religiosos, numa tácita aquiescência ao regalismo. Também notamos que o crime maior era o de "athé terem recorrido a Roma e Castela", onde estavam as sedes mundiais de suas Confrarias. Mesmo os padres desse período se mostravam agora solícitos para com a Coroa, à maneira de funcionários públicos zelosos e fiéis. O contrário sucedera um século antes, em 1698, na comarca

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