O escravo nos anúncios de jornais brasileiros do século XIX

Começos de uma integração ainda incompleta. E isto, principalmente, por ter sido o Treze de Maio uma lei a que não se seguiu um imediato esforço sistemático para essa integração através de uma objetiva preparação do negro livre para esse novo status. Para o status de brasileiro livre. Grande número de escravos de repente livres que vieram para as cidades, de áreas rurais, sem ofícios que os equipassem para se formarem social e economicamente em meios urbanos. Sem instrução. Desprezados por particulares, pelo Estado, pela Igreja. Párias. Párias dos quais foram descendendo, quase sempre, outros párias, sem oportunidades para sua ascensão econômica, social, política, cultural. A falta, no Brasil, daqueles realistas que completassem o lírico, festivo, retórico de 1888. A falta daquela valorização do trabalhador livre, hábil, preparado para ser criativo, ao desejo do transabolicionista que foi Joaquim Nabuco. Um transabolicionista frustrado nos seus empenhos de reforma social, por uma República quase de todo indiferente, com seus Ruis Barbosas e seus positivistas - portanto sociais, a tais empenhos.

Explica-se, assim, que para esses párias fossem, paradoxalmente, menores essas oportunidades do que haviam sido, em não poucos casos, para escravos dos dias da escravidão. Para supradotados, filhos de escravos, como Teodoro Sampaio, que alcançaram altas posições; de todo equivalentes às dos brancos, na sociedade brasileira: como pessoas, como intelectuais, como bispos, como políticos. Vários assim supradotados aos quais faltaram, sendo seus pais livres, porém, desamparados, oportunidades para atingirem as posições a que tinham direito pela inteligência e pelas oportunidades. Vítimas, por falta dessas oportunidades ou dessa valorização, de preconceitos que, parecendo, por vezes, de cor ou de raça, terão sido principalmente de classe ou de cultura: a discriminação contra descendentes de escravos e a discriminação contra analfabetos ou quase analfabetos ou expressões de uma subcultura considerada desprezível.

Discriminação que se prolongaria até os nossos dias. Que em parte explica tanta e tão lamentável ausência de descendentes mais ostensivos de negros e de escravos, em altas posições administrativas, políticas, eclesiásticas, militares, intelectuais, no Brasil atual, dando motivos a que estrangeiros, sobretudo anglo-americanos, acusem os brasileiros de origens mais acentuadamente caucásicas ou europeias de nutrirem preconceitos de raça contra os de origens mais acentuadamente negroides. O que não parece corresponder a uma exata realidade.

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