O escravo nos anúncios de jornais brasileiros do século XIX

Mesmo assim, destaque-se o fato de, por confusão de raça com classe, de cultura com subcultura, não se verificar, atualmente, maior aproveitamento, no Brasil, naquelas altas posições, de descendentes mais antropologicamente evidentes de negros e de escravos. Sua ainda rara presença em ministérios, em embaixadas, em chefias militares, em altas posições eclesiásticas. Como não haver, no Brasil atual, um cardeal descendente de negro e de escravo? Ou um ministro de Estado? Ou um almirante? Ou um embaixador?

Procurados, haveria entre brasileiros desses, do ponto de vista antropológico, de origens nada desonrosas, nada inferiores, nada desprezíveis, indivíduos aptos a exercerem essas altas lideranças e a assumirem essas decisivas responsabilidades. Carlos Lacerda foi o primeiro a lembrar Edson Arantes do Nascimento (Pelé) para embaixador do Brasil em Paris: sugestão logo aplaudida por vários outros brasileiros, entre os quais logo me incluí. Jovem, mas já brilhante economista pernambucano, Cláudio França estaria, atualmente, tão em situação como um Roberto Campos ou um Celso Furtado ou um Delfim Neto ou um Reis Veloso de ser ministro da Fazenda ou do Planejamento do presidente João Batista de Figueiredo. Raimundo Sousa Dantas está apto a voltar a representar o Brasil em posto diplomático ou a ser membro de Conselho de Educação do seu Estado. Na Marinha - como no Exército e na Aeronáutica - do Brasil já existem descendentes ilustres de negros e escravos, também potencialmente valorosos, entre oficiais dos mais capazes: talvez já algum em situação de ser cogitado para ministro, para chefe de Estado-Maior ou para adido naval em Londres ou em Bonn ou em Washington. Ou - é possível - para ministro de Estado na área militar.

Quando no Recife, discursando em Faculdade de ensino superior, Robert Kennedy demagogicamente estranhou não ver entre os estudantes nenhum negro. Havia - eu estava presente - três. Mas havia, entre os talvez 500 jovens universitários ali reunidos, cerca de 300 - talvez mais - com algum sangue negro: percentagem proporcional entre jovens elites do seu país, também de descendentes de negros e de escravos. Para o que chamei a atenção de Kennedy, ao mesmo tempo que lhe recordei o fato de negros de todo pretos, como nos Estados Unidos, terem se tornado, em certas regiões brasileiras, raros, tais os avanços da miscigenação. Tal particularidade não lhe fora explicada pelos assessores que lhe haviam fornecido informações para aquele seu só aparente improviso de demagogo itinerante.

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