O escravo nos anúncios de jornais brasileiros do século XIX

continua a haver quem pergunte - quando no Brasil não se encontram sobrevivências nem maias, nem astecas, nem incas? Nenhuma dessas grandezas pré-históricas?

Todos sabemos, entretanto, que as sobrevivências arqueológicas de interesse antropológico não são apenas as grandiosas. As requintadamente estéticas. As semelhantes às egípcias. Os fundadores do Instituto Arqueológico Pernambucano acertaram denominando-o Arqueológico tanto quanto Geográfico e Histórico. Pode haver Arqueologia sem grandiosidade. Sem ser, na América, a dos maias ou a dos astecas.

Ainda outra instituição recifense se apresenta em condição de interessar antropólogos e sociólogos, além de historiadores. Esta outra instituição surpreendente, um jornal: o sesquicentenário Diário de Pernambuco.

Por que sugerir-se de um jornal, mesmo provecto, ligações com estudos antropológicos? Por que dizer-se que também ele, jornal, marca uma presença de interesse antropológico nesta parte do Brasil? A muitos parecerá de todo esdrúxula a ligação que aqui se sugere: entre um jornal brasileiro, mesmo provectamente antigo, como é o caso, e a Antropologia.

A ligação, entretanto, existe. Existe porque esse jornal do Recife, fundado em 1825, durante anos e anos publicou anúncios e mais anúncios de escravos à venda ou para alugar ou fugidos que já foram identificados por antropólogo como matéria ideal para estudos de Antropologia, quer física, quer sociocultural.

Merece ser assinalado a esse propósito o seguinte: que acaba de ser como que descoberta uma inesperada intuição de Machado de Assis: a de que anúncios em geral - seu ponto de partida foram os de medicamentos ou de curandeiros em particular - poderiam servir a cientistas modernos, que se tornassem equivalentes de egiptólogos antigos, para reconstituições de passados desfeitos ou de civilizações extintas. Surpreendente intuição, a de Machado, com a qual em parte coincidiria - coincidência pura - o esforço, há anos partido do Recife, no sentido do aproveitamento antropológico de anúncios não só referentes a pessoas - não apenas escravos à venda, para aluguel ou fugidos, mas europeus recém-chegados ou já estabelecidos, no Brasil, como artesãos, artistas, profissionais de várias espécies, sacerdotes, educadores, cozinheiros, cabeleireiros -, como também a máquinas importadas da Europa ou dos Estados Unidos para a substituição do trabalho escravo ou do trabalho animal, eles próprios, animais, casas,

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