a que foi submetido secularmente, levantou-se sem motivos concretos, objetivos ao aceno de agitadores sem prestígio social? A indagação formulada por Milet, com palavras e ótica próprias de sua condição e de sua época, ainda hoje se impõe quando, modernamente, com enfoques e posicionamentos diferentes, pretende-se estudar as origens diretas e indiretas desse processo conflitual. A pesquisa documental e a nova metodologia permitem hoje uma análise crítica dos acontecimentos de 1874-1875 que, evidentemente, nem Milet nem seus contemporâneos tinham condições de fazer, porém não há negar que nenhuma análise da economia nordestina nos fins do século XIX teve paralelo com a sua obra.
Avaliada um século depois, a história do Império oferece, em sua evolução, uma perspectiva global que não pode, evidentemente, desprezar as ideias de Milet. As instituições imperiais representavam, já na sua época, um passado incompatível com a economia do País; consequentemente, ou sofreriam profunda e radical transformação ou fatalmente se encaminhariam ao processo de autodestruição. A Abolição da Escravatura e a República são os parâmetros mais fáceis para a constatação do processo.
O grande elogio que se poderia fazer ao reinado de Pedro II é o de sua longa duração. Com o crepúsculo do ciclo revolucionário platino e o término da Revolução Praieira foi imposta ao País uma maquinaria parlamentar que permitiu a reforma centralizadora e a anestesia política traduzida pela famosa conciliação de 1853, orientada por Paraná.
Nas suas tendências absorventes, o Império operou lentamente uma relativa transformação na classe rural detentora de latifúndios, cuja tradição de prepotência e autonomia vinha desde os primeiros tempos do período colonial. A estabilidade do governo de Pedro II, entretanto, sempre fora ilusória, embora permanentemente apresentada como justificativa para continuidade do regime e do sistema contra os princípios republicanos. Os presidentes de província são nomeados pela Corte e os gabinentes ministeriais se revezam sob a vigilância imperial, enquanto uma grande parte de nossa população, escravos e homens livres de baixa renda, na agricultura, que praticamente sustenta a economia nacional, estão marginalizados de todo o processo político. Os motins, as revoltas, as sedições e as revoluções do século XIX, no Brasil, desenvolveram-se quase sempre ao largo desses deserdados da fortuna. As exceções são poucas.