Memórias de um Cavalcanti: 1821 - 1901

bilhas e quartinhas d'água esfriando nas janelas, com os seus filhos pequenos e depois com os seus netos empinando papagaios de papel das varandas — "tapiocas" tristonhas que não subiam tão alto como os "baldes" ou os "gamelos" dos moleques da rua — era, e é um pouco ainda hoje, lugar de muito mucambo perto de sobrados de azulejo; de muita casa de cabra valente e de negra catimboseira e, naquele tempo, de preta da Costa rica e fazedora de mandinga ao lado de habitações de burgueses pacatos, irmãos do Santíssimo Sacramento, alguns com verdadeiro horror a barulho e a feitiço, as senhoras só faltando desfazer-se de medo quando descobriam areia de cemitério ou sapo de boca cosida à porta de casa.

São José era isto: a rua da Jangada e a Gamelleira, a poucos passos da rua Imperial. A rua dos Sete Pecados Mortais emendando com a Direita.

No tempo de Felix a capoeiragem ostentava ainda todo seu viço; e da rua da Jangada e Gamelleira estavam sempre descendo redes não só de bexiguentos como de feridos. Redes brancas de mortos. Redes vermelhas de gente esfaqueada e gemendo: quero água, quero água! Mal começara a campanha do Inspetor José de Lima e dos seus soldados de facão rabo de galo contra os reis da faca de ponta protegidos e até compadres de José Marianno e de outros políticos importantes; gente arranchada pelos mucambos e "quadros" de São José, de Santo Amaro, do Coculo, da Aldeia do Quatorze, da Ilha das Ostras, dos Sete Mucambos, do Pombal, do Lucas.

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