NOSSA DEMOCRACIA SOCIAL
Ora, o que identifica o brasileiro não é o inimigo cordial.
É o não ter capacidade para ser inimigo, cordial ou não. Esta ausência de ódio, de preconceito. Aquilo que os estudiosos denominam a nossa vocação para a fraternidade, em grau mais sensível que a dos outros povos. O que foi, e é ainda, um sonho revolucionário, para outros povos, para nós é um estilo de vida, uma condição menos imposta ou reivindicada porque nascida de hábitos singelos, desprevenidos, característicos de uma democracia social tipicamente brasileira que não nos foi ensinada (são palavras de Gilberto) "nem por Leão XIII, nem por Maritain; nem pelo socialismo inglês, francês ou alemão, nem pelo russo; vem de nossas próprias raízes".
Ora, se é esse o tipo brasileiro — não há em reconhecê-lo nenhuma intenção apologética. O homem bom não significa elogio, como elogio não era a denominação ao homem bom do povo, usada nos documentos portugueses. Como elogio não é o que disse o autor dos Diálogos das Grandezas, a que já fiz referência, ao afirmar que os homens do reino "iam largando a sua ruim natureza" ao contato da terra nova. E aqui esclareço uma outra questão: não tive a intenção de propor homem bom para substituir homem cordial. O que pretendi foi apenas demonstrar que o conteúdo específico da expressão homem cordial calhava melhor em homem bom, ou bom homem — denominação mais modesta e... legal. Isto é, mais expressiva da bondade típica do brasileiro do que homem cordial, que de duas uma: ou serve para indicar atos do coração, inclusive inimizade, etc., e neste caso tanto se aplica ao brasileiro como ao português, ao italiano, etc., deixando de ser a nossa contribuição específica para a cultura do mundo; ou representa apenas o fácies do brasileiro, frente aos problemas humanos, e neste caso não é a denominação que convém, pois homem cordial, em brasileiro, quer dizer