do sertão de cuja intimidade participou por meio século — aceita o "sertão de amanhã" com a mesma deliciosa simplicidade com que aceitou o sertão de ontem.
Pois ao cabo de sua longa convivência com o sertão, modificou lealmente as conclusões que antecipara, no pórtico do livro, e escreve: "Impossível negá-lo: o sertão que conhecemos deixou de ser estacionário, atingido que foi pela lei inexorável da Evolução... Muitas coisas começavam já a transformar-se no último decênio de nossa longa permanência no sertão e agora, notícias que, a cada passo, de lá nos chegam, obrigam-nos a acreditar no desaparecimento progressivo e necessário de um sem-número de realidades pitorescas que, outrora, nos encantavam e que as novas gerações não mais poderão admirar. Uma onda irresistível de progresso material e social, invadindo aqueles longínquos recantos, repele, para mais longe, ou antes, faz desaparecer para sempre, grande parte de tudo quanto foi por nós presenciado e que pertence agora a um saudoso passado. Das transformações materiais surgiram profundas evoluções sociais."
O missionário, porém, não tem alma de Cassandra. O pessimismo ou mesmo o saudosismo não cabem numa alma autenticamente cristã. Em face desse rápido crepúsculo de um sertão em vias de desaparecer, o homem de Deus sofre, sem dúvida. Pois afinal o que vê morrer é um mundo que ele amou de todo o coração e foi a sua própria vida. Mais ainda, é um mundo em que o homem era mais simples, mais transparente, mais direto, mais humano, em suma. E por isso mesmo mais naturalmente cristão. E ele o diz de uma maneira encantadora: "Esvai-se o que poderíamos chamar o perfume encantador da simplicidade sertaneja."
Frase que corta o coração de qualquer leitor "sensível", como se diria em outros tempos, quanto mais o de quem amou entranhadamente essa simplicidade da vida sertaneja e dela participou por meio século. Mas com a mesma candura de coração em que lamenta a perda da "simplicidade sertaneja" alegra-se com os benefícios que o progresso pode trazer, sem se deixar inquietar, como nós outros, pelas perspectivas contraditórias