Os sertanejos que eu conheci

os seus pintainhos. O caçador espera paciente no esconderijo, até que venha a ave, sem desconfiança, ao encontro da bala mortífera.

Se, nessa ocasião, não conseguir matá-la, pode aproveitar da fuga da ave para alcançar o ninho, construído, aliás, sem arte alguma entre moitas de capim. Nesse encontrará uma dúzia de ovos enormes, cada um suficiente para uma boa e gostosa refeição. Pode cuidar dos mesmos em casa até nascerem os pintainhos. Se, em vez de ovos, deparar com os filhotinhos nascidos, terá o gosto de criá-los no terreiro do sítio, junto com galinhas e patos. As emas, assim criadas desde novinhas, acostumam-se de tal modo com a gente que, tornando-se grandes avestruzes, voltam fielmente para perto dos seus donos, terminados seus longos passeios pelos chapadões da vizinhança.

Um detalhe interessante a respeito das emas. Ensinadas por maravilhoso instinto, escolhem sempre, quando preparam o ninho, a proximidade de algum riacho ou, ao menos, de um poção d'água. Como põem e chocam os ovos no período da seca, tempo em que chapadões e tabuleiros ficam anualmente devastados pelas queimadas ou "fogos-gerais", há sério perigo para a ninhada, de ser atingida e aniquilada pelas chamas. A salvação é garantida pela água próxima. De fato, como muitas vezes vaqueiros têm observado, as emas, ao sentirem o fogo avançar, correm ao riacho ou ao poço e ali molham as asas até ensopá-las. Voltam sem demora para sacudi-las em cima das moitas de capim que rodeiam e escondem o ninho. Por essa admirável manobra, repetida muitas vezes, conseguem evitar a destruição da sua futura família.

Apesar das dificuldades da caçada, como também dos serviços prestados pelas emas nos sítios, muitos sertanejos teimam em persegui-las, não tanto em vista da carne, pouco gostosa e quase sempre perfurada por larvas de triquina, mas sobretudo para conseguir as grandes penas, de real valor comercial e que se vendem sempre por bom preço quando aparecem mascates empenhados em comprá-las. Da pele rugosa fazem mantas que colocam por cima dos selins.

De todas as aves da mata as mais cobiçadas pelos caçadores, por causa do delicioso sabor da carne, são os mutuns e os jacus. O mutum é um enorme galináceo, quase do tamanho de um peru. Reveste-o bela plumagem branca e preta, e orna-lhe a cabeça uma crista amarela. Essa ave revela sua presença por uma espécie de gemido em três notas surdas, quando está em cima das árvores, e por um piado agudo e prolongado, quando

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