Geopolítica do Brasil

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UM DILEMA ETERNO DO HOMEM, ANIMAL SOCIAL

HOUVE, EM SÉCULO que já vai bem distante — estes Brasis mal despontavam, então, para seus largos destinos —, um "geômetra da política" que, seduzido pela imponente clareza do monumento euclidiano, com seu sólido embasamento de postulados, de porismas e axiomas diáfanos, seus teoremas bem encadeados e seus corolários surpreendentes, resolveu aplicar, também, o mesmo sistema lógico-dedutivo ao domínio flutuante e incerto da Sociedade e da Política. Era, entretanto, ao tempo em que Bacon e Galileu inauguravam, com brilho e audácia invulgares, a carreira triunfal da ciência moderna, com um método indutivo-experimental recém-saído da forma.

Daquele modo, porém, foi que, repudiando de frente a Aristóteles — heresia tremenda! — e se inspirando sobretudo em Euclides, Thomas Hobbes descobriu e apontou, à adoração reverente e temerosa dos povos, o novo Leviatã, esse deus portentoso, embora mortal, da soberania e do poderio absoluto. Seu raro e agudo engenho tomaria, como ponto de partida, aquele mesmo mito fascinante e estranhamente crível do "contrato social" que, na época, atraía a todos os espíritos, fecundando o liberalismo nascente de que Locke se afirmaria, mais tarde, intérprete inexcedível até hoje, e, por um extraordinário passe de mágica, faria daquele mito o próprio fundamento de sua incrível proposição derradeira — a rendição total da liberdade do indivíduo em aras de um poder soberano, incontrastável e supremo.

O Estado soberano, surgido das fontes profundas do Medo para prover a segurança individual e coletiva na Terra, passaria a afirmar sua vontade onipotente sobre os destinos de todos os súditos que o haviam criado, assim mesmo, inigualável e autárquico, mas, já agora, pela própria necessidade de um raciocínio lógico, escorreito e severo, que o justificaria, de uma vez para sempre, contra todas as críticas e contra quaisquer argumentações. E, assim, em Hobbes encontrariam, ao seu inteiro dispor, os defensores do autoritarismo mais rigoroso — todos os déspotas futuros, esclarecidos ou não; os senhores da guerra; os novos Césares, no tumulto de suas ambições insofridas; as minorias usurpadoras e tirânicas — inteiramente modelada, em linhas inflexíveis e rigorosas, a teoria que lhes absolveria os desmandos e lhes encobriria os caprichos insanos, enquanto se pudessem manter, pelo poder da coação, como governos de fato.

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