agir ofensivamente. Nesse trabalho, apresenta-se a definição de legalidade, baseada na evidência da conjuntura: 'assegurar o funcionamento do Congresso, em coexistência com o Executivo e o Judiciário; garantir o processamento eleitoral, as eleições e a posse do eleito para 31 de janeiro de 66.' Tem você aí a atualidade militar. O IV Exército, na reação legalista, é básico. Basta durar na ação umas 48 horas. Não ficará só." Por certo, não precisava dizer mais.
Ostensivamente liderado pelo deputado Leonel Brizola, que se cercara de notórios comunistas, e com ares de quem ia apossar-se do poder, o governo do Presidente Goulart ameaçava o Congresso. Especialmente a Câmara dos Deputados, onde renascia a "banda de música", designação de um grupo de deputados da União Democrática Nacional, notados pelo vigor e vigilância com que, desde Kubitschek, encarnavam um pensamento de regeneração do país. Sentavam-se habitualmente na primeira fila, prestes para o aparte ferino, a crítica dolorosa, a denúncia dos escândalos administrativos. Estes não faltavam. Bilac Pinto apontara as "negociações ilícitas e fabulosas" do Instituto do Café, e os "intermediários poderosos", que participavam de percentagens nas grandes operações do Banco do Brasil e do Banco de Desenvolvimento. Também o deputado Antônio Carlos Magalhães, a quem sobrava impetuosidade, trouxe à baila as negociatas no Departamento Nacional de Estradas; e, já no fim do Governo Goulart, revelou o imenso e inacreditável patrimônio territorial do Presidente, que, recebida pequena herança, possuía mais de cem mil hectares de terra. Acreditava-se que a subversão se aliara à corrupção.
Tais fatos exacerbavam aquele grupo de deputados, tão convictos de que o mal estava em ter-se um regime infelizmente deturpado pela falta de escrúpulo dos governantes. E acreditavam que o primeiro passo devia ser o da moralização dos costumes políticos. Mais uma vez, a observação de Aristóteles seria comprovada: "As democracias são mais sujeitas às revoluções pela desonestidade dos seus demagogos."
A simples presença de Brizola, na Câmara, irritava aquele punhado de moralistas. Inteligente, inculto, cheio de audácia, ostentando um penacho de homem do pampa, constituíra-se, para os adversários, que o acusavam de graves e numerosos pecados, a imagem do aventureiro, ante o qual viam um fosso ético intransponível, impedindo até a habitual cortesia entre colegas de representação. Certa feita, grave incidente interrompeu o debate que ele travava com o deputado João Calmon.
A "banda de música" dispunha de vários instrumentos, e, enquanto permaneceu na Câmara, Carlos Lacerda foi líder incomparável. Ninguém o excedia, embora integrasse uma plêiade brilhante e ardorosa.