Dois anos no Brasil

num lago que ficava a pouca distância do local em que se encontrara esse bicho descomunal. Porque, a julgar pelo que ouvira, tratava-se do mesmo cuja história fora contada ao cônsul. Entrego, porém, o caso, sem julgá-lo, ao comentário dos leitores.

Tal a minha inquietude quanto à sorte de minha canoa, que ardia por voltar a ela. Despedi-me do padre, agradeci-lhe a hospitalidade e o presente. Ale esperava rever-me, pois nessa mesma tarde partiria para um sítio que ficava na embocadura do Jourouti. Eu e Miguel embarcamos às 4h da madrugada, depois de ter feito um rolo com a pele da cobra que, sem a cabeça, media 19 pés, tamanho já respeitável, comparado com o das serpentes do Jardim das Plantas. Esse couro é o que um visitante a que aludi julgava preparado com vários outros reunidos. Ao descer o rio eu ia com um pressentimento parecido com o que me assaltara nos dias do banho perto dos jacarés e dos alagadiços. Tudo me dizia que não encontraria mais a canoa. E, então, para que me serviria o dinheiro que trazia sempre amarrado à cintura? E minhas coleções, meus desenhos, tudo mais conseguido à custa de perigos e de sofrimentos? Eu mesmo, que seria de mim? Se a minha canoa tivesse levado um fim, com ela se iria o passado e o futuro, a minha pátria, o meu lar. E debaixo dessas reflexões amargas maldizia a curiosidade que me atirara para longe da minha embarcação, e a imprudência de tê-la confiado a Policarpo. A cada curva do rio Jourouti, eu dizia a Miguel: "Eis-nos chegados." Mas enganara-me e meus receios aumentavam. Quanto mais me avizinhava do local em que ficara a canoa mais me sentia opresso. Acho que, se tal estado de ansiedade durasse muito tempo, meu coração teria estourado com o afluxo extraordinário do sangue, pois muitas vezes continha com a mão o ímpeto de seus batimentos. Assim, avistei de longe uma montaria tripulada por três mulheres. Minha sorte ia depender do que elas me informassem

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