disposto a não largá-lo senão em Óbidos. Fui sentar-me à proa ao lado de Miguel e ordenei-lhe: "Vamos", enquanto me respondia com seriedade: "Vaamoos". Descemos o Jourouti com rapidez. Ao cair da noite reentrávamos no Amazonas. Atingimos o roçado do padre; lugar detestável. Nem uma casa; árvores derrubadas por todos os lados; troncos atulhando o solo; trepadeiras. Quase não se podia andar. Armaram a rede do padre perto de uma fogueira. Mosquitos em tal quantidade que escureciam o brilho do fogo. Eu tinha necessidade de repouso e, não vendo jeito de obtê-lo ali, resolvi me despedir. Parece que o sacerdote não me entendeu bem, pois quando já ia distante e lhe fiz sinais de adeus, mostrou-se contrariado. Pensara que eu pernoitaria ali ao seu lado. Não compreendera que em tal sítio, um estrangeiro doente não acharia nenhum repouso. Essa noite dormi em meio do Rio Amazonas, com a canoa ancorada. Estava cansadíssimo.
Depois de ter remado dois dias, puxamos pelos remos para atingir uma ilha situada na margem oposta àquela em que navegávamos; uma tempestade anunciava-se; ouvia-se o trovão e era impossível encontrar abrigo no meio de árvores arrancadas que enchiam a praia. Rapidamente sem nos dar tempo a alcançar a tal ilha, a tormenta desabara. Chuva torrencial, misturada com granizo, fez-nos temer que a canoa se enchesse demais. Miguel lançou suavemente a pedra que nos servia de âncora, dando-lhe todo o cabo, e eu com a panela tratava de esvaziar a embarcação. Os macacos aumentavam com os gritos o barulho do temporal. Só víamos alguma coisa diante dos olhos ao abrir dos relâmpagos. Miguel veio me ajudar no esvaziamento da canoa. Tive de trabalhar de verdade dando o exemplo, apesar da fraqueza orgânica. Se deixasse o índio somente às voltas com o temporal, ele acabaria cedendo ao fatalismo da raça e morreríamos ambos.