O Selvagem

recebe da Europa, as que lhe vieram da África ou as que lhe vieram dos indígenas. Ora, as lendas em questão não são africanas nem europeias, pois os animais que nelas figuram são sul-americanos, assim como americanas são as árvores, as circunstâncias, os hábitos e costumes que aí se descrevem, com tão admirável singeleza e propriedade.

Em matéria de contos populares, é essa talvez a mais rica mina que, logo abaixo do mito se pode explorar para escrever a história do pensamento primitivo da humanidade: não há talvez, no mundo inteiro, país que ofereça melhor oportunidade para se colherem tão grandes riquezas, como o Brasil, justamente porque, assim como aqui, no imenso cadinho de nossa pátria, se fundem atualmente os sangues dos grandes troncos branco, negro, amarelo e vermelho, assim também se fundem as tradições e crenças primitivas, o pensamento espontâneo de todos esses troncos. Ah! Que imenso e rico museu não temos aqui nos quartéis do nosso exército, onde os soldados são mestiços vindos de todas as províncias! Que imenso museu vivo não possuímos para preparar a história do pensamento primitivo da humanidade! Cumpre não desprezar essa mina riquíssima que possuímos em nosso país, visto como, explorando-a e estudando-a, podemos concorrer para o mais belo monumento intelectual do século XIX, e que consiste, na opinião convencida do sr. Beaudry, em refazer a história do pensamento espontâneo da humanidade, o qual se encontra hoje somente em duas formas: na do mito e na do conto popular.

Cumpre, porém, não confundir, estes dois vestígios antiquíssimos do pensamento humano, e eu, para distingui-los, peço permissão para transcrever as palavras