O Selvagem

As coisas que estavam espalhadas pelo rio se transformaram em patos e em peixes. Do paneiro gerou-se a onça; o pescador e sua canoa se transformaram em pato; de sua cabeça nasceram a cabeça e o bico do pato; da canoa, o corpo do pato; dos remos, as pernas do pato.

A filha da Cobra Grande, quando viu a estrela D'alva, disse a seu marido:

— A madrugada vem rompendo. Vou dividir o dia da noite.

Então ela enrolou um fio, e disse-lhe:

— Tu serás cujubim.

Assim ela fez o cujubim; pintou a cabeça do cujubim de branco, com tabatinga; pintou-lhe as pernas de vermelho com urucu, e, então, disse-lhe:

— Cantarás para todo sempre quando a manhã vier raiando.

Ela enrolou o fio, sacudiu cinza em riba dele, e disse:

— Tu serás inambu, para cantar nos diversos tempos da noite e de madrugada.

De então para cá todos os pássaros cantaram em seus tempos, e de madrugada, para alegrar o princípio do dia.

Quando os três chegaram, o moço disse- lhes:

— Não fostes fiéis. Abristes o caroço de tucumã, soltastes a noite e todas as coisas se perderam, e vós também, que vos metamofoseastes em macacos, andareis para todo sempre pelos galhos dos paus.

(A boca preta e a risca amarela que eles têm no braço dizem que são ainda o sinal do breu que fechava o caroço de tucumã e que escorreu sobre eles quando o derreteram).

NOTA — Esta lenda é provavelmente um fragmento do Genesis dos antigos selvagens sul-americanos. É talvez o eco degradado e corrompido das crenças que eles tinham de