Cumpre, porém, não esquecer que estamos diante de povos pagãos, cuja moral não é cristã; portanto, não há de estranhar se, para mostrar o ascendente da força intelectual sobre a física, eles não escrupulizam em empregar a astúcia e o engano como manifestações legítimas da inteligência.
O jabuti, que não tem força física, apostou com o gigante a ver quem arrastaria o outro. Cada um tomou a extremidade de uma corda; o jabuti devia puxar de dentro d'água o gigante de terra. Aproveitando-se desta circunstância, o jabuti mergulhou e amarrou a corda na extremidade da cauda de uma baleia e, nadando para terra, por baixo d'água, veio esconder-se na margem, de onde presenciou a luta, até que o gigante, reconhecendo que não podia vencer, deu parte de cansado; o jabuti mergulhou de novo e, desatando a corda, saiu para terra e cantou vitória.
O jabuti chegou a um buraco de árvore; estava tocando sua frauta. Caipora ouviu e disse:
— Aquele não é outro senão o jabuti; eu vou apanhá-lo.
Chegou junto da porta do buraco da árvore.
O jabuti tocou sua frauta: fin, fin, fin, culó, fon, fin. Caipora chamou:
— Oh! jabuti!
O jabuti respondeu:
— U!
— Vem, jabuti, vamos experimentar a nossa força.
O jabuti retorquiu:
Nós vamos experimentar assim como tu quiseres.
Caipora foi ao mato, cortou cipó, trouxe o cipó à beirada do rio e disse ao jabuti:
— Experimentemos, jabuti; tu n'água, eu em terra.
O jabuti disse:
— Bom, Caipora.
O jabuti saltou n'água com a corda, foi amarrar a corda na cauda da baleia. O jabuti voltou para terra e escondeu-se embaixo do cerrado. Caipora puxou a corda; a baleia fez força e arrastou o Caipora pelo pescoço até à água. Caipora fez força, porque queria pôr em terra a cauda da baleia. A baleia fez força e arrastou Caipora pelo pescoço até a água. O jabuti, embaixo do cerrado, via e estava rindo. Caipora, quando já estava cansado, disse:
— Basta, jabuti!
O jabuti riu-se, saltou na água e foi