Vou tornar este pensamento bem claro, figurando um exemplo. Suponhamos que alguém nos viesse fazer a seguinte proposta: proponho que os brasileiros, em vez de comerem carne de vaca, feijão e arroz, se alimentem de lagartixas e jacarés, o que lhes custará muito mais caro ou muito maior trabalho.
Creio que concordarás em que não seria fácil sujeitar-nos a isso. Sem palmatoadas, tronco e jejum seria muito pouco provável que aceitássemos a proposta. Depois de aceitá-la a poder de pancada, jejum e tronco é muito natural que cada um de nós fosse rebelde e executasse o serviço de apanhar lagartixas para comer com muita má vontade.
Pois bem: é isso justamente o que sucede ao índio que aIdeiamos. Exigimos que trabalhe para ter um sustento que ele repele, tanto como nós repeliríamos o jacaré e a lagartixa; privamo-los de alimentos que prefere, e que ele teria quase sem trabalho, continuando no gênero de vida semi-nômade que lhe é natural. Como isto é contra seus costumes, não é provável consegui-los sem castigos: castigamo-los e, depois de degradá-los, dizemos: preguiçosos, estúpidos e maus!
Não fora muito mais útil e ao mesmo tempo muito mais cristão aprender a sua língua, para podermos ensinar-lhes a nossa, e não aldeiá-los, porque o aldeiamento traz como consequência forçada isso que acabo de referir, e que o simples bom senso convencerá a qualquer pessoa que queira refletir sobre o assunto?
Toda tentativa para civilizar índios, que não se assente sobre a base fazer com que eles compreendam as vantagens de nossa civilização, o que só se pode conseguir gradualmente, e o ponto de partida é o ensino da língua, tudo que não for isto, como disse, e não me pejo de repeti-lo, é um atentado contra o senso comum.