Viagens aos planaltos do Brasil - Tomo II: Minas e os mineiros

no rio das Velhas, chegamos a enseadas, bancos de areia, represas naturais e artificiais, tendo ao fundo a massa azulada da serra.

A cachoeira é formada por uma muralha fragmentada que se estende quase de um lado a outro do rio, na direção noroeste a sudeste. A argila dura é recoberta de ferro e as rochas informes enristam-se quase verticalmente. No centro fica a principal queda com cerca de três pés de altura. Um canal poderia ser aqui facilmente aberto.(3) Nota do Autor Bordejamos a metade do talvegue, rente à margem oriental e, depois de seis minutos, fomos impelidos para um recôncavo coberto de plantas aquáticas verdejantes, duras bastante para constituírem uma boa forragem; entretanto o piloto ficou à frente para dirigir as operações. À sombra do arvoredo das margens, o escoar e borbulhar das frias águas produziam uma cantilena adormecedora. Era curioso ver o velho piloto equilibrando-se como um dançarino de corda-bamba sobre um tronco oco.

Abaixo da queda principal há três canais. O que fica à esquerda da coroa verificamos ser raso demais. Acima do banco de areia há uma passagem cheia de obstáculos que abandonamos por causa das pedras a sotavento. Mas entre essas rochas e a ilhota pedregosa está o caminho livre. O rio estava então no seu ponto mais baixo da vazante e os ramos secos das margens mostravam que nos últimos dias havia baixado duas polegadas. Na coroa encontramos pela primeira vez as conchas bivalves do molusco dos rios(4) Nota do Autor que se espalha pelo rio São Francisco abaixo, e que é apreciado como isca para peixes.

Depois de labutar por perto de uma hora, tomamos a margem esquerda e ancoramos perto da foz de um pequeno riacho, escoadouro de um pântano, São Gonçalo das Tabocas. Foi aqui que a tripulação mudou suas roupas gotejantes e protegeu-se contra o reumatismo com um bom gole de rum. Às 2h20min retomamos o trabalho, passamos por várias coroas(5) Nota do Autor e atingimos as alturas da serra do Paulista. Às 4h30min enfrentamos a cachoeira das Prisões. É formada por uma coroa de seixos grandes entre os quais brotam tufos de relva. Na ponta norte havia um maciço das maiores árvores que vi nesta região. Como o canal da direita era muito estreito, tomamos o esquerdo e descemos aos trancos ao longo da ilhota. Não foi fácil escaparmos de um ressalto no rio, obstáculo aumentado pela presença de várias rochas. Os peixes mandins roncavam como sapos e grunhiam como porcos sob nossos remos.

Nesse dia o sol estava ardente e até uma hora da tarde não soprava nenhuma brisa. À medida que descíamos, a atmosfera apresentou uma notável alteração, como o ar do Mediterrâneo depois do canal da Mancha. Não há nada que possa ser mais agradável do que essa

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