exemplo, quando estes pela primeira vez se puseram de boas pazes com os Botocudos, um outro chefe apareceu no "Quartel" e pediu, importunamente, grande quantidade de artigos de ferro. Estando, por então reduzida a guarnição do "destacamento" e numerosos selvícolas o cercassem, achou-se prudente anuir-lhe aos desejos. Pouco depois chegava o "capitão" Gipakeiu; os portugueses queixaram-se-lhe do que acontecera, ao que ele se internou na mata, obrigando os conterrâneos a restituir grande parte dos instrumentos. Abraçou-me várias vezes à moda portuguesa, mas a nossa conversa foi muito curiosa, pois nenhum de nós entendia o outro; entretanto, o "capitão" fez-me logo compreender que estava com muita fome e esperava que eu lhe desse algo de comer: satisfazer o apetite insaciável é sempre a mais urgente necessidade desses selvagens.
Depois de o regalar com farinha de mandioca e angariar-lhe mais ainda o favor, mandou ele buscar à choça da floresta alguns objetes para trocar; entre os quais se destacava uma buzina curta,("cunischun cocann")*Nota do Autor, feita com o rabo do tatu grande (Dasypus maximus, "Grand Tatou" ou "Tatou premier" de Azara)**Nota do Autor.
Os selvagens usam-na para conclamar a população da floresta.
Defronte ao "quartel" do outro lado do rio, existe um bananal, já antes mencionado como obra de alguns botocudos; havia nele cabanas abandonadas, onde enterraram duas mulheres. Por esse tempo, à chegada do Capitão, queimaram as cabanas, pois jamais ocupam habitações que serviram de túmulos. Várias outras, entretanto, foram construídas nesse lugar; a vida e a atividade reinavam na mata umbrosa, pois os recenvindos não ergueram as moradas somente na margem, porém muito mais para dentro da floresta. Por toda parte se viam jovens trigueiros, uns tomando banho no rio, outros fazendo arcos e flechas, trepando nas árvores atrás dos frutos, fisgando peixe, etc. Os homens se dispersaram para todos os lados da mataria vizinha, chamando-se uns aos outros, apanhando lenha ou ocupando-se em outras tarefas. Formavam o quadro admirável de uma república de selvagens construindo uma nova colônia, e não se podia contemplar sem prazer a agitação que ia entre eles.
Quando o "capitão Gipakeiu" chegou com sua gente ao Quartel, cada um deles trazia dois paus compridos, como desafio à borda de Jucakemet, que esperavam encontrar ai, mas que, conforme dissemos antes, ficara prudentemente no Salto, na margem sul do rio. O "capitão" Gipakeiu permaneceu, com o seu povo, alguns dias próximo do posto, internando-se depois nas florestas da margem norte, para colher os diversos frutos que então amadureciam. Isso é costume entre todos os selvícolas. Conhecem a época exata em que os frutos sazonam,