O dia seguinte descerrou-me magnífico panorama selvático. Até aonde alcançava a vista só se viam as cimas verde-escuras e sombrias das árvores, que se adensavam em selvas primitivas e impenetráveis, onde o rude "Patachó" e o "Machacari" dividem a soberania com a onça e o tigre negro.(361)Nota do Tradutor Duas planuras, no meio das quais se erguia uma eminência, indicavam o lugar em que os dois braços do Jacurucú (antigo nome indígena do Rio do Prado) descem, um em direção norte, outro em direção sul: o primeiro recebe o nome de Rio do Norte, o segundo o de Rio do Sul.(362)Nota do Tradutor Distinguia-se, ao longe, a Serra do João de Leão e a de Sto. André, que pertencem à Serra dos Aimorés, cadeia de montanhas situada a quatro dias de viagem do litoral, não longe da "cachoeira" do rio, onde dizem que a caça e o peixe são abundantes. O Jucurucú cedo começa a estreitar-se, quando se sobe às nascentes: prova de que o seu percurso não é muito grande. Não distante do lugar em que então me achava, os dois braços se unem para formar o rio: mais para cima, toda colonização europeia cessa por completo; pois no Rio do Norte não há absolutamente nenhuma, e existe apenas uma colônia no do Sul, que fica logo depois da junção dos dois braços. Quando me fartei da bela e romântica paisagem, dirigi-me à margem do rio, às habitações dos índios. Entre estes encontrei uma mulher da tribo dos "Machacaris", que entendia perfeitamente a língua dos "Patachós", coisa muito rara; porque, sendo os últimos, de todas as tribos aborígenes, os mais desconfiados e discretos, é difícil a uma pessoa, que não pertença à tribo, aprender-lhes a linguagem. Perto daí, quase para dentro, no recesso da floresta, existe uma "aldeia" de "Machacaris", já várias vezes por mim mencionada, mas onde apenas cerca de quatro famílias desse povo vivem juntas numa casa. Tinha muita vontade de conhecer também essa tribo e, por isso, fui até lá com alguns índios. O caminho era muito incômodo, pois tivemos, durante meia légua, de vadear águas e pântanos e de passar por cima de muitos troncos de árvores caídas.
Encontrei todos os selvagens morando juntos numa casa espaçosa; aí viviam perto de dez anos e eram sofrivelmente civilizados. Alguns mostravam-se cordiais e sociáveis, outros, ao contrário, ariscos e reservados; alguns falavam um pouco de português, porém entre eles sempre faziam uso da língua nativa. Possuíam, para uso próprio, plantações de mandioca e de um pouco de algodão e milho. O "ouvidor" forneceu-lhes um engenho para moer ou ralar as raízes da mandioca; mas, de acordo com o costume dos ancestrais, tiram da caça grande parte da subsistência. O arco e a flecha são-lhes ainda as armas habituais, se bem alguns sejam também destros no uso da espingarda. Os arcos dos "Machacaris" diferem dos das outras tribos, tendo entalhado na parte anterior um sulco profundo, onde uma flecha