Eça e o Brasil

O fato é que novas ordens - desautorando o ministro da Guerra e o governador das Armas - foram transmitidas ao general Avilez, no sentido de ser a reunião dissolvida à força. Parece certo, diz ainda Otávio Tarquínio, invocando Varnhagen, Oliveira Lima e Tobias Monteiro, que partiu de D. Pedro a decisão última do emprego de meios violentos.(2) Nota do Autor

Aos primeiros tiros, de pólvora seca, estabeleceu-se o tumulto. Um soldado caiu, apunhalado. Seguiu-se a fuzilaria, desta vez de verdade. Varejada a Praça do Comércio a bala, baioneta e coronhada, houve quem, no pânico, se atirasse ao mar; outros se refugiaram em pequenas embarcações. Os elementos mais exaltados foram presos e recolhidos à Ilha das Cobras. Muitos haviam sido os feridos, entre eles José Clemente Pereira. No chão, morto, ficara aquele Miguel Feliciano de Sousa, que tanto vinho distribuíra aos companheiros e a si mesmo. O primeiro surto de oratória liberal, a que assistira o Rio, dera à cidade uma Aleluia tumultuosa e uma Páscoa de sangue.

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Quem quiser ainda pode ver o edifício em que o ouvidor Queirós viveu tantas horas tensas. Desapareceu, é certo, a "rica varanda de ferro com ornatos de bronze dourado",(3) Nota do Autor que precedia a entrada principal. No mais, porém, em seu aspecto externo, o prédio é substancialmente o mesmo de 1821. Tendo sido logo abandonado pelos comerciantes, desgostosos com o que ali ocorrera, passou a ser ocupado pela Alfândega. Agora distante do mar, em virtude dos sucessivos aterros, e não mais vendo o início da Rua do Sabão - a Rua General Câmara que o progresso fez desaparecer -, o velho edifício, nas belas linhas que lhe deu Grandjean de Montigny, defronta-se, sem constrangimento, com os arranha-céus do Rio moderno. Abriga, atualmente, o Segundo Tribunal do Júri.

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