Eça e o Brasil

certeza de que tenha ido para Verdemilho ainda em vida do avô, que faleceu em 1850. Todavia, a tradição, transmitida pela maioria dos biógrafos e por um filho do escritor, Antônio d'Eça de Queirós, é que assim ocorreu.

Na obra de Eça de Queirós só há uma referência direta a Verdemilho, ou, mais exatamente, a um dos seus moradores. No artigo "O francesismo", que está nas Últimas páginas, ele invoca a sua mais remota recordação, que é a de ter escutado, "nos joelhos de um escudeiro preto, grande leitor da literatura de cordel" histórias de Carlos Magno, dos Doze Pares e de João de Calais. Esse preto, alçado à dignidade de escudeiro - e que ressurgiria no Grilo, de A cidade e as serras - só pode ser um dos dois escravos que o desembargador levara do Brasil. No artigo, o ponto a demonstrar era o da influência francesa a que ele, Eça, tinha sido submetido. Histórias francesas, por isso, são as que consigna. Mas o preto escravo forçosamente lhe contaria muitas outras e entre elas haveria de incluir histórias dos lugares de onde viera.

À avó não há referência, embora seja ela, talvez, aquela avó que passa, em uma linha de romance, "espalhando funcho e âmbar para afugentar a sorte-ruim". Ao avô igualmente não há menção. Mas um dos seus personagens de maior ternura é um avô, como o desembargador, mais velho que o século: - Afonso da Maia.

Se de fato conheceu o velho Queirós - e faz bem acreditar que neto e avô se tenham encontrado - também ele deve ter falado ao menino das terras longínquas e diferentes em que andara, às quais se chegava após muitas semanas de mar.

Ficam, pois, duas imagens de sentido especial para os leitores brasileiros de Eça, tão acostumados a visualizar a sua obra.

Uma é a do ouvidor Queirós, neste Rio de Janeiro, há cento e cinquenta anos, empertigado na sua casaca de briche, andando por trechos da cidade que ainda se conservam, apenas mudados os nomes. Saindo, por exemplo, do Paço, onde o chamara el-rei, atravessando o Largo rente à Capela Real, e encaminhando-se, pela Rua Direita, para ir distribuir justiça na rua que tinha, e ainda tem, o nome do seu cargo.

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