Sincretismo religioso afro-brasileiro

somente histórias de trancoso, verdadeiras histórias do arco da velha, mas ainda episódios ligados à história lendária do Recife, histórias fabulosas, fantásticas, algumas relacionadas com a vida do negro, histórias que me causavam um frenesi de medo. Deste medo que desperta curiosidade. Que dá vontade de saber mais, de bisbilhotar, de ver com os próprios olhos aquilo que se ouve contar. Histórias de feitiços e de bruxarias. Histórias de benzeduras e de mau olhado. Histórias de negras velhas catimbozeiras. Dessa senhora escutei as primeiras informações sobre a dança dos negros nos terreiros e sobre as confrarias negras do Recife. Foi ela quem me despertou a atenção para o toque dos tambores, essa mensagem misteriosa dos xangôs.

Certa vez, recordo-me perfeitamente, estava eu passando uns dias na casa de um parente, no Pina, isso por volta de 1923. Era véspera de Natal e todos se conservavam acordados até tarde. Ouvi um ruído surdo e monótono de tambor, que parecia vir de longe. Lembrei-me do que me havia falado D. Xandu. Senti uma vontade louca de penetrar no mistério do xangô. De vê-lo de perto. De assistir às suas danças. De conhecer o que de extraordinário e secreto dentro dele se passava. Embora tomado de certo pavor, não pude livrar-me da curiosidade, que era muito maior. E guiado pelo toque dos tambores, consegui aproximar-me do local onde funcionava um terreiro, que ainda hoje não sei de quem era nem onde ficava precisamente. Já então o ruído era ensurdecedor. As toadas que eu ouvia, incompreensíveis, misturavam-se ao barulho que o batuque violento dos tambores produzia. Era um casebre miserável. Um mocambo quase caindo, todo de palha, inclusive as paredes. Um pouco afastado, com uma emoção que me

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