Uma simples referência ao uso ou à ausência de cantos em determinada zona presta-se de ordinário a generalizações descabidas. Na realidade, o canto não constitui elemento obrigatório das reuniões de trabalho, e é mesmo desconhecido em muitos lugares. Mas aqui e ali se observa o hábito de acompanhar a faina com o auxílio de cantos, especiais ou não, com sentido preciso ou obscuro. Mais comumente, não se trata de cantos, mas de palavras com inflexões de aboio ou simplesmente sons emitidos no instante exato de um esforço físico maior, como, por exemplo, os que escapam da garganta do machadeiro ao descarregar o golpe na árvore. Amadeu Amaral, aludindo a este aspecto, escreveu com muita acuidade:
"Quando um ajuntamento de pessoas do povo se ocupa no transporte de objetos pesados, derruba de uma árvore, se entrega à fúria dos "mutirões", todos sentem a irresistível necessidade de cantar. Muita vez, o canto não tem palavras e se resume na repetição de gritos alongados, a intervalos regulares. Às vezes, as palavras aparecem, mas nada exprimem de inteligível, percebe-se bem que seu sentido é o que menos importa e que elas se resumem num simples pretexto. Outras vezes, enfim, esse sentido se manifesta e se precisa, e surgem então composições bem feitas e bonitas. Mas estas composições bonitas não são de regra, são exceções, e exceções mais raras com efeito do que pode parecer através de certas coletâneas muito escolhidas, onde se teve o cuidado de fixar unicamente as versões mais limadas - e talvez acabando de se limar"(8) Nota do Autor.
Contrariamente ao que se observa em alguns países, como o próprio Portugal, onde se associam por vezes aos trabalhos agrícolas realizados em conjunto e