O acordo São Paulo-Minas Gerais, que o humor popular não demora a chamar de "café com leite" (São Paulo é produtor de café e Minas Gerais de leite), não pode por si só explicar o sucesso da fórmula. É preciso levar em conta outros fatores, três em particular: a "política dos governadores", a fraude eleitoral e a ausência de ressonância nacional dos partidos políticos.
A "política dos governadores" faz par com o acordo "café com leite", pois implica que o governo central se abstenha de qualquer intervenção nos negócios de cada estado da Federação. Isto é, estes são inteiramente livres em sua política econômica, comercial, financeira e em sua organização política. Cada estado tem sua própria constituição, sua bandeira e seu hino. Essa liberdade é a condição sine qua non para que o resto dos membros da Federação aceitem o embargo de São Paulo e Minas Gerais sobre o poder central.
O acordo "café com leite" não exclui as eleições, já que é preciso respeitar uma aparência de legalidade. Trata-se de eleições muito particulares, pois o candidato "oficial", isto é, aquele que recebeu o apoio do presidente em final de mandato, jamais conhece a derrota. Para recolher tão brilhantes resultados, o poder central tem de mostrar muita imaginação e organização. Esta se baseia em uma fraude eleitoral de regra. O voto não é secreto nem generalizado, e um Estado como São Paulo beneficia-se do fato de que tem um número de votantes mais elevado do que os outros para fazer distanciar os candidatos da oposição. Inexistem controle eleitoral em nível nacional e com frequência abrem-se as urnas sem a presença de ofício. Às vezes constata-se até mesmo a existência de um número de cédulas maior do que o de inscritos nos registros eleitorais ou, ainda, uma troca de cédulas "desfavoráveis" por cédulas "favoráveis"(19). Nota do Autor A fraude nessas condições é generalizada. Mas é no meio rural, em que um "coronel" todo-poderoso reina como senhor, que os abusos são mais graves. Isso se realiza sobretudo em benefício do poder central, que se esforça para assegurar a simpatia dos grandes proprietários agrários dos diferentes estados da Federação. Com efeito, por sua política econômica, as vantagens fiscais concedidas, a ausência de preocupações sociais - como uma melhor distribuição de terras, por exemplo - fazem do governo central o protetor da oligarquia agrária. Em uma sociedade como a nossa, em que os grandes proprietários sempre desempenharam um papel político de primeiro plano através do "coronelismo" e da formação das clientelas eleitorais, pode-se medir melhor o interesse que o