Encontramos nesta tentativa dois obstáculos principais. O primeiro provém dos informantes. A lei do segredo existe. Mas os chefes do culto, que muitas vezes tiveram de sofrer perseguições policiais, hesitam sobre os limites do segredo. Compreendemos muito bem que recusem desvendar certas sequências do ritual de iniciação, que recusem a penetração em sociedades secretas como a dos Eguns. Compreendemos menos que ocultem o mundo dos mitos. Muitos fogem a divulgá-los porque têm sido de tal modo enganados que temem ver se voltar contra eles mesmos uma palavra por demais confiante que deixaram escapar. Há todavia um meio de ultrapassar este primeiro obstáculo. A religião do candomblé, embora africana, não é religião só de negros. Penetram no culto não somente mulatos, mas também brancos e até estrangeiros. É preciso dissociar completamente religião e cor da pele. É possível ser africano, sem ser negro. A penetração no mundo dos candomblés se opera por meio de uma série de iniciações progressivas, de cerimônias especializadas, abertas àqueles que são chamados pelos deuses, qualquer que seja sua origem étnica, e é à medida que se vai penetrando no interior do santuário que os mistérios vão sendo apreendidos. São principalmente os sacerdotes que têm a noção do valor do tempo; é o tempo que amadurece o conhecimento das coisas; o ocidental tudo quer saber desde o primeiro instante, eis porque, no fundo, nada compreende. Como dizia um dos meus informantes: "Toda a semana, todo o mês, ensinarei ao senhor algo de novo, pouco a pouco..." Assim devagarinho, a poder de paciência, de amizade recíproca, a filosofia africana vai se desvendando, por etapas. Se ainda não se tornou conhecida, ou se é insuficientemente conhecida, foi porque toda a atenção se tem voltado quase unicamente para o culto público; foi porque o preconceito inconsciente da