que, no meio da mercadoria portuguesa, não viessem muitos produtos da indústria inglesa, que só ela se beneficiaria com essas vantagens. Isso mesmo observou o ministro norte-americano William Hunter ao regente Feijó, acrescentando que aumentaria assim a dependência do Império com relação à Grã-Bretanha e se agravaria o déficit em sua balança comercial. O projeto afinal foi derrotado na Câmara, por pequena diferença, apesar de todos os esforços do representante diplomático de S. M. Fidelíssima, Joaquim Antônio de Magalhães, que não se cansava de brindar os legisladores com a magnificência de seus banquetes, bailes e recepções, que repercutiram muito na imprensa.
É certo que tais assuntos fogem aos limites cronológicos fixados para o estudo de Maria Beatriz Nizza da Silva, mas não me parece muito tentar um relance sobre os fatores que vão provocar uma continuada erosão na paisagem social espelhada em seu livro, correspondente a uma época em que o Brasil, elevado afinal a Reino, deixara de ser nominalmente colônia, mas sem alcançar rigorosamente o estatuto de nação soberana. Dessa forma se patentearia melhor o que oferece de estimulante e fecundo o tipo de abordagem dos problemas históricos adotado no presente livro. Também não creio que seja ilícito querer explorar, no terreno das ideias, daquilo a que a autora, interpretando livremente uma sugestão de Clyde Kluckhohn, denominou "cultura explícita", um aspecto que não cabe estritamente entre as "Áreas do Saber Ciências e Artes" e, menos ainda, nas "Belas Letras" tratadas na segunda parte da obra, ou sejam as palavras e obras dos homens que construíram o Brasil independente. A matéria, contudo, mal poderia ser desenvolvida dentro do espaço tolerável de um simples prefácio, nem é meu desejo comprometer a autora numa tese controversa e que de há muito me é particularmente cara. Ou seja, a de que, no Brasil, o processo de emancipação não chegou em nenhum momento a ser um processo revolucionário, e de que nenhum dos homens, mesmo os mais atrevidos, que forjaram o clima de sentimentos propício à nova ordem de coisas, pensou, então, em termos de autêntica revolução.
Seja como for, não parece fácil descobrir um autêntico revolucionário nas palavras onde até Cipriano Barata, nos manifestos dirigidos à Bahia contra as Cortes, alude aos "princípios anárquicos" de seus perseguidores portugueses, fala na "nova nomenclatura de liberalismo, que em outros tempos se chamava jacobinismo", e expressamente se proclama "inimigo de revoluções quase sempre fatais". No mesmo documento chega a declamar contra os