do século XVIII. A anedota e o panfleto ridicularizador do tempo de De Foe deram o passo seguinte na direção do "sentimento disfarçado em sátira", tão do gosto anglo-saxão. Da sátira à crítica moral e política, o caminho era curto. Samuel Richardson (1689-1781) representou a transição que ilustra a integração do espírito clássico francês ao common sense satirizante e inglês. Tais características culturais não somente influenciaram os wits, como eram chamados os homens de espírito na Inglaterra do século XVIII, como ainda os aproximaram das lides políticas desse fim de século, nas quais se imiscuíram alguns dos aludidos intelectuais(1) Nota do Autor.
Que os reparos feitos pelos críticos e homens de espírito do tempo influíssem e fizessem titubear politicamente, antes da decisão final, homens como Pitt, parece natural, desde que se leve em consideração o panorama das ideias do país naquela época. A sua renúncia foi uma espécie de marco da regressão instalada no panorama político britânico desde 1793.
A continuidade desse processo de regressão precisou ser imposta pelo governo e por isso o toriísmo endureceu e tornou-se cada vez mais intransigente. Não sendo ratificado pela vontade popular, colaborou para o desenvolvimento de crescente dissidência entre o governo e grande parte do povo daquele país: tal estado de coisas teve forçosamente de refletir-se nos problemas do governo, em especial nos anos subsequentes a 1815, a partir de quando o término da guerra suprimiu a desculpa do perigo externo. Entre essa data e a do suicídio de Castlereagh, e consequente ascensão de Canning, abriu-se na Grã-Bretanha um período de agitações e também de clara transição. Assim, a ascensão de Canning em 1822 ter-se-ia revestido daquelas características que fazem de certos acontecimentos marcos de uma era.
O excelente trabalho de Temperley, The Foreign Policy of Canning, à p. 43, procura dar ênfase à viragem política que na Grã-Bretanha teria representado a ascensão de Canning ao posto de ministro do Exterior em 1822. Afirma este autor que Canning opõe sua política "inglesa" à política "europeia" de Castlereagh. Entretanto, no volume de documentos publicado em 1938, isto é, 13 anos mais tarde, em colaboração com Lilian Penson, o mesmo Temperley cita palavras desconcertantes de Canning, quando este afirma "ter baseado sua política em relação à Europa no State Paper de 5-5-1820 de autoria de Castlereagh". Essas declarações de Canning parecem ter sido na verdade um seu expediente com o possível objetivo de tentar relacionar sua posição nova e dinâmica face à Europa Continental, com normas preestabelecidas e consequentemente já aceitas pelo Establishment(2) Nota do Autor.