História da alimentação no Brasil – 2º volume: sociologia da alimentação

observando homens do Maranhão e Piauí. Identicamente, em todo o Nordeste. Finais do século XX.

O repúdio pela nudez. Comer despido é ofender o "Anjo da Guarda". Comer com o chapéu na cabeça é comer com o Diabo. Quando cai comida no chão, da boca ou do garfo, é sinal de parente "passando necessidade". Não se levanta comida do solo porque é das almas. Vinho derramado é alegria. Sal derramado é agouro. Donzela não serve sal, não corta galinha nem "passa" palitos. Recebe-se o prato com a mão direita e devolve-se com a esquerda. A direita é de bênção para o prato cheio. A esquerda é maldição para o prato vazio. Beber sobejos é ficar sabendo os segredos de quem deixou. Não se oferece o primeiro nem o último bocado. Terminando refeição amiga deixa-se o guardanapo aberto para o convidado voltar. Deve deixar-se um pouquinho de comida no prato. É a "cerimônia". Não se joga pão fora. É corpo de Deus. Antes de findar o repasto não se cruza o talher. Agouro. Farinha no chão é prenúncio de fartura. Engasgar-se com saliva é sinal de fome velha. Das aves o pedaço de honra é o uropígio, oferecido ao homenageado. Não se come carne verde em casa de defunto recente. Enquanto se come, evita-se dizer "nome feio" para não desrespeitar o Anjo da Guarda que assiste o comer dos cristãos. Mulher não deve beber vinho primeiro do que os homens. Mesmo que haja pessoa de respeito à mesa, o primeiro pedaço é dado ao dono da casa para não desejar sua morte. Se ele recusar, o perigo passou. Donzela não deve ficar na cabeceira da mesa senão fica solteira. Acabada a refeição, os convivas postos nas extremidades da mesa, levantando-se, devem saudar-se para que um deles não morra antes de findar o ano. Dinheiro em mesa de comida provoca miséria. Dezenas e dezenas de reminiscências acusam a surpreendente vitalidade dos interditos sagrados na alimentação.

Um dos mais conhecidos e vulgares na Europa e América é o tabu dos treze, evitar treze convidados à mesma mesa de refeição.

A tradição sinistra do dia treze e do número treze é muito anterior ao Cristianismo. Mommsen não encontrou um só decreto em Roma datado do dia 13. Mommsen conhecia mais de 200 mil inscrições latinas do Orbis Romanus. A exclusão sistemática é visivelmente deliberada. Já Hesíodo, sete séculos antes de Cristo, aconselhava a não semear no décimo terceiro dia. Salomon Reinach observa: "Le treizième jour du mois fût déjà évité par les anciens, en qualité de TRITHÉ de la seconde décade". Na festa em Asgard, onde morreu o deus Balder, estavam presentes treze seres divinos(196) Nota do Autor.

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