da herança colonial e às forças de desagregação do tradicionalismo localista que ameaçavam, não somente a unidade nacional, mas também a continuidade da ordem social, que os estadistas do império se empenhavam em manter intata. O processo de centralização administrativa contribuiria para moderar os surtos de constitucionalismo liberal, limitando a arregimentação espontânea de forças políticas e assim permitindo a continuidade dos privilégios das ordens constituídas.
Certas noções implícitas na obra de Southey transcenderiam os limites de sua época e, através dos positivistas ou dos herdeiros do idealismo historista dos alemães, persistiriam na historiografia brasileira do século XX, presentes na obra de Gilberto Freyre ou de Oliveira Viana. Nossa motivação inicial, ao abordarmos a obra de Southey, foi o interesse pelo estudo das matrizes ideológicas da historiografia e da consciência nacional. Neste livro, entretanto, limitamo-nos a integrar a obra de Southey na ideologia de seu tempo, de preferência a esmiuçar "influências" e a acompanhar o enraizamento dos valores europeizantes na historiografia brasileira.
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Robert Southey ficaria para a posteridade, na literatura inglesa, como o autor do conto infantil dos três ursos, das biografias de Nelson e de Wesley. Foi um homem profundamente enfronhado nos problemas de sua época e do meio em que vivia, de onde provinham as raízes do seu interesse pelo império português. Desde o início de sua carreira como escritor, interessou-se pela literatura de viagens e resenhou os primeiros livros ingleses sobre o Brasil, como o de Thomas Lindley; interessou-se pela obra de John Mawe, de Henderson; manteve contatos pessoais com Maria Graham, William May, James Gooden; estimulou e orientou a elaboração do livro de John Luccock e de Henry Koster, pelo qual tinha grande amizade.
Entretanto, nenhum interesse direto pelo meio brasileiro, que não conheceu, pois nunca visitou ou residiu no Brasil, motivaria sua obra. Parece intrigante que, apesar disso, tivesse vislumbrado com grande lucidez alguns aspectos da realidade brasileira que anos mais tarde seriam abordados pelo revisionismo crítico dos fins do século. Além disso, na História do Brasil, acenaria para temas como a mestiçagem, a expansão geográfica e a interação com o meio ambiente, que somente Capistrano de