o papel principal; resultando, daí, que se vem a dar tanta, e até mais, importância à representação do signo vocal do que ao próprio signo. É como se acreditássemos que, para conhecer alguém, é melhor olhar sua fotografia do que o seu próprio rosto.
Essa ilusão existiu sempre, e as opiniões correntes que se trazem a tiracolo acerca da língua estão por ela contaminadas. Assim, acredita-se comumente que um idioma se altera mais rapidamente quando não é escrito: nada mais falso.(*)Nota do Autor A escrita pode, na verdade, em determinadas condições, tornar mais lentas as alterações da língua, mas inversamente, a sua conservação não é de nenhum modo prejudicada pela falta de escrita. O lituano que se fala ainda hoje na Prússia oriental e numa parte da Rússia só é conhecido por documentos escritos depois de 1540; mas por essa época tardia, ele oferece, no conjunto, uma imagem tão fiel do indo-europeu quanto o latim do século III antes de Jesus Cristo. Isto é bastante para mostrar quanto a língua é independente da escrita.
Certos factos linguísticos muito sutis se têm conservado sem o auxílio de nenhuma notação.
A língua tem, pois, uma tradição oral, independente da escrita e, por outro lado, fixa; mas o prestígio da forma escrita impede-nos de vê-la. Os primeiros linguistas se enganaram quanto a isso, como já antes deles se haviam enganado os humanistas".
E entre as causas desse prestígio da escrita aponta SAUSSURE a língua literária.
"A língua literária", diz ele, "aumenta ainda a imerecida importância da escrita. Ela tem os seus dicionários, as suas gramáticas; é pelo livro e de acordo com o livro, que se ensina na escola; a língua aparece regulada por um código; ora, esse código é ele próprio uma regra escrita, submetida a um uso rigoroso; a ortografia, eis aí o que confere à escrita uma importância primordial.