Língua brasileira

O artifício dos nossos clássicos falhou. A língua brasileira retomou os seus direitos na literatura: no romance, no conto e na poesia. São páginas de arte, de emoção e de beleza, onde o sentimento estético se traduz nos módulos e na riqueza da nossa gama verbal.

Levando em linha de conta que a Réplica, de Rui Barbosa, pode ser considerada o padrão da doutrina clássica, a lição suprema da linguagem vernácula para os puristas - alcorão dos partidários da soberania do idioma português nas nossas letras - submetemos ao gume da crítica os fundamentos que lhe alicerçam os preceitos e doutrinas. Analisamos as suas lições acerca do dialeto e da vernaculidade, dos neologismos e da escrita literária.

Não cabe à justa nos conceitos da linguística e da estética das letras o que se encontra estampado nas páginas da Réplica. Não é possível negar, como ali se pretende, a existência do dialeto brasileiro. Não é aceitável a opinião que a vernaculidade do nosso idioma nacional seja a mesma da língua portuguesa. Outra é a terra, outra é a gente, outra é a língua. O alamiré do ouvido português não pode ser o diapasão da nossa eufonia vocabular.

Nada na ciência da linguagem, nem na história das literaturas, impõe que nos não possamos afastar da escrita dos clássicos portugueses quanto à estrutura e os valores da nossa gramática. A ordem natural das cousas é o perpétuo devir. O próprio gênio das línguas não permanece o mesmo. O povo, os escritores lhe modificam as linhas, as nuanças, os claro-escuros. É a lição dos doutos. Só nos idiomas empalhados, nas línguas mortas pode ele estacionar. E ainda assim, algumas vezes a literatura é capaz de insuflar-lhe vida nova, transfigurando-o nas suas páginas. O latim místico do cristianismo é um exemplo magnífico. Os doutores da Igreja afeiçoaram ao seu pensamento religioso à língua pagã dos Cíceros e dos Horácios. E há quem julgue aquele latim transfigurado mais belo que o dos clássicos de Roma.

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