Os bororos orientais. Orarimogodogue do Planalto Central de Mato Grosso.

as sobrancelhas escassas, pronunciavam o seu uh! (sim) profundo e demorado, num gesto significativo e típico da tribo.

Aquela excursão fora o epílogo de uma convivência de três meses com os bororos, e veio açular-me desejos de ver sempre mais conhecida a grande obra do missionário católico naquela imensa hinterlândia em flor da minha terra.

Eu já conhecia o seu maravilhoso plano catequético, todo pontilhado de abnegações, sacrifícios e heroísmos, na formação das novas gerações e no traçado das futuras cidades. Mas ao lado disto, quantas conquistas etnográficas, filológicas, científicas, votadas ao desconhe: cimento, ao desvalor, ao olvido!

Verdade é que, em 1908, dera a Missão Salesiana um primeiro passo com a publicação da Gramática e Dicionário da língua dos boróros. Foi muito, mas ainda pouco, e isto devido também à extrema urgência, que presidira àquele trabalho.

Hoje sei que a Missão, comemorando as suas bodas de prata, a par do bicentenário do Estado, fará publicar novos estudos sobre a etnografia daqueles caros índios, bem como Noções de Catecismo em língua bororo, e a presente História do Brasil, que, num gesto para mim muito expressivo de gentileza, quis dedicar ao Presidente do Estado.

Das mãos do Presidente, porém, passou desde logo o mimo para o coração do mato-grossense e do Bispo salesiano.

Coincidiu oportunamente com esta floração da indianologia mato-grossense, a publicação do Vocabulário da língua dos bororos, feita por Basilio de Magalhães, no tomo 83 da Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, belo trabalho, bem cuidado e escorreito, que tanto honra a capacidade de trabalho, erudição e paciência do autor, quanto a revista, que lhe deu guarida em suas páginas veneráveis.

Ao agradecer, pois, com este prefácio, a oferta de tão simpático e patriótico livrinho, fora meu desejo demonstrar o que ele, deveras, significa, isto é, um largo passo avante em a nossa interessante e ainda misteriosa filologia indígena. Sobre não parecer, porém, asado o presente ensejo, falecera-me, o que é mais, competência para discorrer sobre tão altas questões de linguística indiana, como se faria mister para analisar convenientemente, cotejando-o com outros, um opúsculo que vai representar, por certo, a mais fina flor da rude literatura dos bororos.

Não deixarei, entretanto, de resumir nestas laudas umas poucas das simples anotações do meu canhenho de viagem, concernentes ao idioma em que vai escrito este livrinho, algumas delas, talvez, ainda de todo inéditas.

A esta língua, como a tupi, que se encontram ambas em sua fase aglutinativa, faltam alguns dos fonemas vernáculos, quais os representados pelas letras "f", "l", "s" e "z", sendo que o "j" e o "x" tem sempre o som de "dj" e "tx".

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