Os bororos orientais. Orarimogodogue do Planalto Central de Mato Grosso.

Estudos mais profundos descobrirão certamente novas analogias. Para estímulo basta o que aí fica.

"Vejam agora os sábios, na Escritura,

Que segredos são estes da Natura".

A língua dos bororos possui, como, aliás, o tupi, o luxo de duas formas para o adjetivo possessivo e o pronome pessoal da primeira pessoa do plural, conforme se queira compreender ou não, a pessoa ou pessoas, a quem se fala. No primeiro caso, dir-se-ia págui = nós ou simplesmente ; no segundo, xégui ou , o que mal remediamos com a expressão "nós outros".

Não existe, porém, no idioma dos bororos, como tão pouco no tupi, o verbo substantivo, que é suprido pela partícula re, como, por ex..: Kigádo = branco, Kigadúre = é branco. Daqui se deriva o interessante sufixo rêu = re-u = "o que é", ou, no plural, rêugue = re-ugue = "os que são", servindo para substantivar as palavras. Assim de Kigádo, Kigadu-réugue os que são brancos; de cúri = grande, curi-reu = o que é grande, de pêga = mau, pegareu = o mau; de bi = morrer, biréu = o que morreu = o morto, bi-réugue = os mortos.

Quando não tem lugar o verbo ser, forma-se o substantivo, pospondo-se apenas o afixo u ou ugue, v. gratia bure-tada = no pé, bure-tadá-u = "o que está no pé" = calçado; Bocukége = no campo, Bocu-kege-ugue = os que estão no campo; meririco-paru-kege = "no fim do fio telegráfico" = na estação, meririco-paru-kegê-u = "o que está na estação" = o telegrafista.

Concluirei estas ligeiras notas com algumas observações a respeito de dois vocábulos indígenas, ao que se me afigura, ainda pouco estudados.

São eles: maeréboe e o próprio termo bororo.

Acerca do primeiro, pensa Basílio de Magalhães que foi "criado pelos salesianos catequistas" (obra citada).

Não descabe aqui notar a nímia severidade, com que Basilio de Magalhães se refere aos trabalhos linguísticos dos salesianos. De fato aquela primeira obra de 1908 está eivada de incorreções, explicáveis, aliás, em grande parte, pela premência, com que fora ultimada, para figurar na Exposição Nacional daquele ano, no Rio de Janeiro. Assim, no vocábulo Oqua = lobinho, acrescenta ele: "Sal. dá como significado sobrinho (!)". Ora, este ponto de admiração ou espanto não tem razão de ser, porquanto entre "lobinho" e "sobrinho", é fácil de ver o cochilo tipográfico. Tão difícil é, ao contrário, evitar, de todo, esses deslizes! O próprio B. de Magalhães dá aredrôgo "menino", quando é "menina" (aredo-rogo = mulher pequena). Para o citado vocábulo oqua, B. de Magalhães dá a tradução "lobinho (doença)" parecendo assim que não signifique "lobinho (animal)". Entretanto, esta última significação posso garanti-la; quanto à primeira, não me

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