supremo, que nos casos de ira, posto que justificada, nos manda vossa santíssima lei, que não passe de um dia, e que antes de se pôr o sol tenhamos perdoado: Sol non occidat super iracundiam vestram. (Ephes. IV — 26). Pois se da fraqueza humana, e tão sensitiva, espera tal moderação nos agravos vossa mesma lei, e lhe manda que perdoe e se aplaque em termo tão breve e tão preciso; vós que sois Deus infinito e tendes um coração tão dilatado como vossa mesma imensidade, e em matéria de perdão vos propondes aos homens, por exemplo, como é possível que os rigores de vossa ira se não abrandem em tantos anos, e que se ponha e torne a nascer o Sol tantas e tantas vezes, vendo sempre desembainhada e correndo sangue a espada de vossa vingança? Sol de justiça, cuidei eu que vos chamavam as escrituras, (Malach. IV — 2) porque ainda quando mais fogoso e ardente, dentro do breve espaço de doze horas, passava o rigor de vossos raios; mas não o dirá assim este sol material que nos alumia e rodeia, pois há tantos dias e tantos anos, que passando duas vezes sobre nós de um trópico a outro, sempre vos vê irado.
Já vos não alego, Senhor, com o que dirá a terra e os homens, mas com o que dirá o Céu e o mesmo Sol. Quando Josué mandou parar o Sol, as palavras da língua hebraica, em que lhe falou, foram, não que parasse, senão que se calasse: Sol tace contra Gabaon. (Josué X — 12). Calar mandou ao Sol o valente capitão, porque aqueles resplandores amortecidos com que se ia sepultar no ocaso, eram umas línguas mudas com que o mesmo Sol o murmurava de demasiadamente vingativo; eram umas vozes altíssimas com que desde o céu lhe lembrava a lei de Deus, e lhe pregava que não podia continuar a vingança, pois ele se ia meter no ocidente: Sol no occidat super iracundum vestram. E se Deus, como autor da