Deus lhe mandou, em sentido averso, guardar sim, trabalhar não; assim podemos dizer, que se perde também o Brasil, porque alguns de seus ministros não fazem mais que ametade do que el-rei lhes manda. El-rei manda-os tomar Pernambuco, e eles contentam-se com o tomar. Se um só homem que tomou, perdeu o mundo, tantos homens a tomar, como não hão de perder um estado? Este tomar o alheio, ou seja o do rei, ou o dos povos, é a origem da doença; e as várias artes e modos, e instrumentos de tomar, são os sintomas, que, sendo de sua natureza mui perigosa, a fazem por momentos mais mortal. E senão, pergunto, para que as causas dos sintomas se conheçam melhor: Toma nesta terra o ministro da Justiça? Sim, toma. Toma o ministro da Fazenda? Sim, toma. Toma o ministro da República? Sim, toma. Toma o ministro da Milícia? Sim, toma. Toma o ministro do Estado? Sim, toma. E como tantos sintomas lhe sobrevém ao pobre enfermo, e todos acometem à cabeça, e ao coração, que são as partes mais vitais, e todos são atrativos e contrativos do dinheiro, que é o nervo dos exércitos e das repúblicas, fica tomado todo o corpo e tolhido de pés e mãos, sem haver mão esquerda que castigue, nem mão direita que premie; e faltando a justiça punitiva para expelir os humores nocivos, e a distributiva para alentar e alimentar o sujeito, sangrando-o por outra parte os tributos em todas as veias, milagre é que não tenha expirado.
Como se havia de restaurar o Brasil (não falo de ontem nem de hoje, que a enfermidade é muito antiga, ainda mal) como se havia de restaurar o Brasil, se ia o capitão levantar uma companhia pelos lugares de fora, e por não lhe fugirem os soldados, trazia-os na algibeira? E como após este ia logo outro do mesmo humor, que os trazia igualmente arrecadados, houve pobre homem