referisse conhecidamente à virtude de Deus, e não às armas de Saul. Se David levara ao desafio as armas de Saul, pudera-se atribuir a vitória às armas, e não à virtude e mercê de Deus; pois para que a vitória se atribua a Deus, cuja é, e não às armas do rei, fiquem as armas de fora, não se acham na batalha: Deposuit ea. O mesmo digo neste caso. Verdade é, que não chegar o socorro das nossas armas e munições, foi por vir o aviso tarde; mas debaixo dessa razão natural e humana havia outra superior e divina, para que a vitória se não atribuísse ao socorro das armas d'el-rei, senão à virtude e mercê de Deus: Ut virtus dei apertê monstraretur, et non armis, quae fiebant mira, adscriberentur.
E não foi só esta razão a que canonizou esta vitória por vitória e mercê de Deus, senão outras muitas, e mui conhecidas. Primeiramente terem os nossos tão antecedente aviso de que vinha o inimigo, e por via dos mesmos holandeses; que foi, senão mercê de Deus particularíssima? Não há coisa mais ordinária no Testamento Novo, que comparar-se a morte ao ladrão. Em São Lucas: Si sciret paterfamilias, qua hora fur veniret.(145)Nota do Autor No Apocalipse: Veniam ad te, tamquam fur;(146)Nota do Autor e
em outros muitos lugares. A razão da semelhança dá o mesmo Cristo no Evangelho; porque assim com a primeira treta do ladrão é dar de súbito a assaltar de repente, quando os homens estão mais descuidados; assim a morte nos assalteia e nos rouba a vida, sem sabermos o dia nem a hora: Quia nescitis diem, neque horam.(147)Nota do Autor O mesmo pensamento temos no nosso texto. Repara São Pedro Crisólogo em chamar Herodes aos Magos, e se informar deles em segredo: Tunc Herodes, clam vocatis Magis.(148)Nota do Autor